skip to main | skip to sidebar

30 de novembro de 2008

MÚSICA






Escandalosamente roubado à SIALA AP MAEVE.
Vão lá ler a história deste autor Facundo Cabral






29 de novembro de 2008

HOMENAGEM A MAURICE BÉJART II




CONTINUANDO COM JACQUES BREL


AU PRINTIMPS





ROSA





LA VALSE À MILLE TEMPS




28 de novembro de 2008

ROXANNE






Ali está ela no meio de Paris, sentindo-se senhora do mundo, dezassete anos acabados de fazer, bebendo o ar que lhe faltava para viver, esse ar que há anos esperava por respirar.
Filha de mãe italiana e pai português que pertenceu ao corpo diplomático, Maria do Rosário, tinha vivido em meio mundo, falava cinco línguas, alemão, italiano, espanhol, francês e inglês, línguas de países onde tinha vivido. Tinha dezasseis anos quando seu pai morrera. Tinha passado só um ano, mas a transformação na sua vida fora profunda.
Paris, foi a cidade pela qual ficou fascinada desde que ali tinha vivido durante 4 anos, dos oito aos doze. Sempre fora o seu sonho, sempre falara nele aos seus pais que nunca a tentaram demover, ir para a Sorbonne tirar Sociologia.
Agora sem pai e com a mãe a querer voltar para Itália, debilitada com o desgosto, concorrera a uma bolsa de estudo e conseguira ganhá-la. Ficaria mais perto da mãe.
Parada já no Quartier Latin, olha para um lado e para outro sem saber por onde se há de decidir, para começar a viver o sonho há tanto tempo acalentado.
Atravessa o Jardim do Luxemburgo e dirige-se à Sorbonne, para ficar a saber onde se vai instalar, pelo menos nos primeiros tempos. Tem de ver se arranja trabalho, porque a bolsa é curta para a carestia de vida que existe em Paris.
Gostava de mais tarde arranjar uma casa com uma ou duas colegas. Logo se veria.
Não dava pelas pessoas que ao se cruzarem com ela, a olhavam encantadas. Sabia que era bonita, mas ainda não estava consciente da sua profunda beleza, da sensualidade que transmitia, do ar exótico que os enormes olhos escuros contrastando com a pele muito clara lhe davam. O cabelo farto, comprido, dourado, onde os reflexos do sol abriam laivos arruivados e meio encaracolado davam-lhe um ar meio selvagem aliado a uma alegria e vivacidades naturais, o seu metro e setenta e cinco, pouco vulgar numa mulher nesse tempo, faziam que quem passasse por ela não ficasse indiferente a essa junção explosiva.
Atirou com os cabelos para trás e entrou decidida pela porta da frente da Universidade.
Hoje, que era o primeiro dia em que estava sozinha em Paris para cumprir um sonho, para comemorar a sua chegada queria ir a um dos célebres cafés.
A mãe, tinha-lhe falado de tantos, mas ela gostaria de poder ir ao “La Closerie des Lilás”, matar saudades dos tempos em que lá ia com os pais, mas não tinha dinheiro suficiente. Resolveu então ir comer um crêpe a um dos restaurantes Breton, junto à estação de Montparnasse. A fome já apertava e começou-lhe a crescer água na boca só de pensar.
E lá foi sorrindo, de mapa na mão, andar tão leve que mais parecia que dançava ao som de uma qualquer música interior, do que andava.
Parou à entrada a olhar, estava cheio de uma multidão de gente nova, risos pelo ar, vozes que de vez em quando se alteavam, gargalhadas que estalavam, até que foi chamada por uma rapariga que já estava sentada a uma mesa com diversa companhia.
Tinham-se conhecido nesse dia na faculdade, quando estavam as duas, ela e Eloíse, Lise para os amigos, como logo lhe dissera, a tentar saber onde ficavam as instalações que iriam ser as suas casas durante uns tempos. Lise que agora a chamava, era da Bretanha, extrovertida e simpática. Feliz por não ficar sozinha, avançou de encontro àquelas caras joviais e alegres.
As apresentações foram informais como era próprio daquelas idades.
Já estava em Paris há três meses, o dinheiro rareava e conseguira arranjar emprego como criada de mesa de um restaurante.
Lise já tinha alugado uma casa com uma espanhola, Pilar, mas como precisavam de uma terceira pessoa, desafiaram Maria do Rosário, que com pena disse não ter ainda dinheiro para o fazer. Avisaram-na que esperariam por ela.
Estava um dia a servir no restaurante, quando lhe fizeram uma proposta para ir fazer testes para a agência de modelos, Élite, que acabava de ser fundada por John Casablanca e Alain Kittler.
Nem pensou duas vezes e no dia seguinte apresentou-se na Élite, para fazer os testes exigidos.



26 de novembro de 2008

REVISTA PLÁTANO







O MÁRIO CASA NOVA MARTINS faz uma revista a "PLÁTANO" em Portalegre. Foi feita a apresentação do Nº4, no dia 1 de Novembro.
Só por falta de tempo, não falei ainda dela.
Uma revista cultural, com colaboradores de impressionante curriculum, que esgota a cada número que sai, linda e onde aprendi, como é costume com o Mário.
Há uns meses atrás, o Mário, convidou-me para escrever uma das minhas histórias para este número da sua revista.
Tremi perante a responsabilidade, mas a Ana Maria, como amiga que é, deu-me um empurrão e mandou-me passear, a mim e ás minhas parvoíces.
Funcionou. Escrevi.
Obrigado Ana Maria!
Nunca poderei agradecer o suficiente ao Mário, por ter acreditado em mim, por ter corrido este risco, por me ter convidado para uma revista com semelhante qualidade, por me ter dado a hipótese de ver uma história minha, escrita em letra de forma.
Eternamente agradecida, Mário. Bem Haja!
Deixo-a aqui para ver se gostam.

Três Mulheres...Uma Geração



Estávamos na paragem do autocarro que nos levaria ao liceu, onde as três andávamos desde o início, quando ela apareceu, direita, cabeça bem levantada, ar apressado, características que ainda hoje mantém, para iniciar os dois últimos anos do liceu, vinda de colégios de Freiras.
Nunca imaginaríamos, naquela altura, o vendaval de ar fresco, de irreverência, de independência, de transgressão de gargalhadas, que varreria as nossas vidas.
Foi logo no segundo dia que, quando entrou a única Professora de Moral que existia no liceu, mulher dos seus sessenta anos vestida, como era hábito, de saia escocesa encarnada, e meias de lã até aos joelhos da mesma cor, se ouviu uma gargalhada sonora, irresistível, que por ser tão proibida, pôs a turma toda a rir, quebrando o gelo.
Pior que as gargalhadas só as discussões que Rosarinho tinha com a Setôra que se tornaram lendárias no liceu. Rosarinho tudo punha em causa. As suas opiniões por serem tão diferentes, não poucas vezes nos levaram às gargalhadas, enquanto Rosarinho olhava para nós não parecendo compreendê-las. As faltas colectivas, a Moral, começaram a chover. A fúria estalava, a Professora dizia-a imoral, e ela respondia que tão-somente amoral.
Não se tornaram mais graves, por termos na turma as que viriam a ser as duas melhores alunas femininas em Portugal: a Mónica com média de vinte, seguida pela Rosarinho com média de 19,8.
Foi aí que começou a doutrina.
Ainda hoje me espanto, por uma miúda com dezasseis anos se atrever a dizer, naquele tempo, a uma professora, que do seu ponto de vista, a Professora estava enganada.
E as discussões continuavam pelo intervalo fora, já só entre nós, com argumentação forte.
Mónica contrapunha com inteligência, defendia-se bem, sem nunca pôr nada em causa.
Isabel e eu enfeitiçadas.
Rosarinho lá passou de tímida a revolucionária, por intrinsecamente não ter qualquer sentido hierárquico, ou melhor, por, tão só, não reconhecer hierarquias. Gravitávamos à sua volta em menos de nada, Mónica incluída.
Mónica, Isabel, Rosarinho e eu, as quatro da vida airada.
A meio da faculdade, Tomás namorado de Isabel, mais velho cinco anos, quis casar antes de ir para a guerra. Por influência de todas nós, mas principalmente da Rosarinho, Isabel acabou por dizer que queria acabar o curso, deixando-o partir sozinho.
A que mais mudou desde o liceu e repentinamente foi Mónica, a mais brilhante, a mais culta, também a mais conservadora, depois de conhecer um Smith, partiu com ele para conhecer mundo, deixando o quinto ano de Direito por fazer. Por influência de Rosarinho, que dizia que o Direito não fugiria. Voltou três anos depois para o acabar, com médias superiores.
Rosarinho a mais inquieta acabou o curso de História que nada lhe dizia, entrando para um museu, mundo parado demais para toda aquela inquietude. Fez o, ou dos primeiros MBA que apareceram em Portugal e é hoje uma reconhecida gestora.
Quando Tomás voltou, traumatizado, alcoolizado, casou com Isabel, que decidiu deixar de trabalhar, já com o estágio de advocacia feito.
Tivemos algum medo, que Isabel a estouvanada, não aguentasse uma vida de clausura.
Saiu-se bem, arranjando novos interesses, sendo mãe, recuperando Tomás, e ainda hoje dá gosto vê-la sentada no chão encostada às pernas de Tomás, que brinca sempre com os seus cabelos. Têm quatro filhos.
Mónica apaixonava-se ora aqui ora ali, desaparecendo às vezes no estrangeiro por meses. Talvez por ter sido a que mais tarde se rebelou contra o “status quo”, tivesse demorado mais tempo a perceber que poderia ser o que quisesse, que não teria de aceitar integralmente o “estabelecido”, que o poderia reinventar, que precisava de saber o que lhe faltava para se sentir feliz. O sinal de amadurecimento apareceu quando decidiu fazer o Doutoramento, casando pouco depois com Luís. Tem dois filhos e luta por ser devidamente reconhecida na sua carreira de juiz, e na de Professora Doutora. Há dois ou três anos atrás, para lhe não darem um cargo que merecia, ouvi alguns notáveis dizer que era inconstante...julgada por dez anos de vida, entre os vinte e dois e os trinta e tais, “esqueceram” os vinte e oito anos posteriores. Ainda têm medo das mulheres brilhantes, inteligentes e independentes, alguns homens.
Rosarinho a mais exigente continuava só. Irreverente, inteligente, de sorriso fácil e gargalhada espontânea, independente como poucas, sem papas na língua, assustava os homens que dela se aproximavam. Dizia ela que, só amaria um homem muito especial e que só um homem assim a aceitaria, o que era verdade, principalmente um homem da nossa geração. Teria acabado de fazer trinta anos quando se juntou com o Pedro, que soube respeitar a sua independência, e a sua constante provocação. Têm também dois filhos, nunca tendo casado.
Divórcios? Só o meu.
Mónica, Isabel, Rosarinho e eu, as quatro, que continuamos, da vida airada
Mulheres da minha geração, que se bateram pela igualdade, pela independência, pela carreira, pela vida familiar, pelo Amor, pela Felicidade, pelo Sucesso e que conseguiram tudo obter.
Mulheres da minha geração, que romperam com o establishment renegando o passado, fazendo a ponte com um Futuro desconhecido, principalmente na educação dos filhos, sem terem nenhuma hipótese de feedback, saindo-se muito bem.
Mulheres da minha geração, corajosas, que souberam tudo pôr em causa, antes do 25 de Abril, procurando o que seria melhor para elas, tendo a coragem, em alguns casos, de retomarem os passos renegados, deixados para trás, reconstruindo-os de maneira surpreendente.
Mulheres da minha geração, que sonharam mudar o Mundo, mas que definitivamente, ajudaram a mudar o seu País.
Mulheres de Sucesso, que lutaram, que sofreram, que caíram e se levantaram, que procuraram e encontraram, que não desistiram, Mulheres que souberam ser Felizes.
Enfim, MULHERES! que tenho o privilégio de ter por Amigas.


24 de novembro de 2008

DOIS IRMÃOS




Eduardo Naranjo




Ainda o Claras Manhãs não estava aberto, quando abriu um blog só dedicado ao ELEVADOR e que vale a pena espreitar, UM CONTO PARA UM ELEVADOR
Mandei três textos que coloquei, era obrigatório ter um blog, no Claras o Contestatário. Como sei que muitos por lá não passam, e preciso de uma folga (sorriso), hoje coloco aqui um deles.




Para eles, o elevador antigo, era sempre uma aventura.
Por ele fugiam, porta de lagarta aberta e antes de chegarem ao seu interior tinham de abrir, ainda, as duas portas de vidro, elegantemente trabalhadas em gravação a fosco, fugiam de quem não lhes queria bem.
Por ele entravam no, que eles chamavam, calabouço, embora nunca tivessem estado presos, presos ficavam os seus sonhos, desfeitos mal entrassem em casa.
Saiam no elevador contentes assobiando, sabendo já que haveria represálias, mas mesmo assim a aventura chamava por eles, porta fora chegavam ao exterior.
Entravam nele, cabeças baixas, pensando já no que lhes iria acontecer, pensativos perguntando-se um ao outro se valeria a pena subir.
Tão novos, tantos sonhos já desfeitos e desciam, subiam, subiam e desciam, assim passavam a vida.
Lembrava-se disto tudo, enquanto o elevador ia subindo, aos anos que não fazia esta viagem de elevador, o irmão já morto... espreitando o primeiro andar que continuava igual, entrando por ele adentro a sensação que nunca tinham percebido o movimento do elevador, os seus arranques as suas hesitações, que se podiam comparar à sua vida.
Segundo andar, já bem modificado, visto ser de escritórios, porta da rua escancarada para todos poderem entrar.
Quando desciam no elevador, era como descessem ao melhor que deles tinham, a alegria, os sonhos, a magia da vida, que bastava uma gargalhada para toda ser diferente. Quando subiam nele, entravam no pior que neles havia, a violência que os marcara para o resto da vida, o desamor que se refletiria, também, na vida do dia-a-dia, as raivas e os medos
Já ia no terceiro andar, tremeu só de pensar que estava a chegar ao pior que tinha havido nele, ao pior que havia na sua vida, o irmão já morto....
Resolveu, no pouco tempo de permeio entre o terceiro e o quarto andar, que desta não seria apanhado desprevenido, não se deixaria ir abaixo, far-lhe-ia frente, se queria mudar.
Quarto andar, o fatídico, ainda hesitou dentro, mas de rompante abriu de par em par as duas portas de vidro, elegantemente trabalhadas em gravação a fosco, abriu ainda com mais energia a porta de lagarta e quando já tinha saído e se preparava para as portas fechar, ouviu um risinho de desprezo que dizia:
- então ainda estás vivo? Não te suicidaste como o teu irmão? Sempre disse que eras um cobarde! Como te atreves ainda a subir nesse elevador
e num repente, esqueceu-se de todas as boas intenções, pôs um pé na rede que separava o corrimão da escada, do fosso e de um salto deixou-se cair, como tinha feito o irmão ainda adolescente.


23 de novembro de 2008

22 de novembro de 2008

HOMENAGEM A MAURICE BÉJART





FAZ HOJE UM ANO QUE MORREU MAURICE BÉJART
COREÓGRAFO EXCEPCIONAL QUE ABRIU AS PORTAS AO BALLET MODERNO
A partir de hoje e durante alguns fins de semana, poderão encontrar aqui a minha homenagem ao grande coreógrafo que foi MAURICE BÉJART
Começo com a música dita ligeira, não deixem de ver os três videos, porque valem a pena.
Em qualquer dos três videos, a música e a coreografia são um espanto

COMEÇO COM A DIVA BARBARA:


LA SOLITUDE






QUAND REVIENDRAS TU





L'AIGLE NOIR




21 de novembro de 2008

ROXANNE



ÀS SEXTAS








Olha-se ao espelho com ar crítico.
Ninguém lhe dá a idade que tem, e sorri interiormente, lembrando-se da disciplina férrea que a si própria impôs durante toda a vida, ou melhor, desde que fora estudar para Paris.
O jornalista tinha-a deixado espantada pelo atrevimento; sempre pensara que o que corria sobre ela na cidade, e não só, teria sido suficiente para ele não ter tido a ousadia de lhe vir fazer semelhante proposta.
Ainda irritada, resolveu telefonar a Sofia para desabafar e também para não a deixar a morrer de curiosidade sem saber o que lhe quereria aquele jornalista.
- Sofia? a curiosidade mata-te um dia destes, rapariga! Qual quê! Em vez de estares a fazer perguntas deixa-me contar-te a proposta que me fez.......
sim, fez uma proposta......
não não era desonesta, era idiota.....
posso contar-te ou não?
calcula que vinha todo atencioso, falinhas mansas, propor-me escrever um livro sobre a minha vida, mas “subtilmente” deu a entender que seria ele a fazê-lo, porque eu, pobre desconchavada, não o deveria saber fazer!.....
não me tentes acalmar!.....
claro que estás a ver a minha irritação! Conheces-me bem.
vês o que continuam a pensar de mim, só por ter esta profissão? Querem lá saber se sou culta, ou se falo cinco línguas! querem lá saber que venha gente de quase toda a Europa para conhecer a minha casa! Querem lá saber porque tenho tanto sucesso! continuo com o A de atrasada mental, com o P de prostituta e sei lá quantas mais letrinhas….
vê lá tu, que quando lhe disse redondamente que não, atreveu-se a dizer que era uma oportunidade de publicidade, que ninguém perderia.
E Roxanne ri-se divertida enquanto ouve a resposta da sua assistente e maior amiga.
- Claro que foi corrido, apesar de ter estado sempre com o meu sorriso nº 3. Como se nós precisássemos de publicidade! Então desta!
Sabes o que me enervou? Ter-me posto a rever todo o filme, mas penso que não me arrependo de nada....
está bem Sofia, se calhar não me quero recordar de tudo.
beijinho minha querida, vemo-nos amanhã no escritório.
está descansada, conto-te todos os pormenores.
Roxanne desliga o telefone sorrindo ainda, sorriso esse que se vai transformando em enorme nostalgia, que lhe vela o olhar e toda a expressão.
Abana a cabeça e toda a cabeleira dourada escura, acompanha o movimento.
Recosta-se num sofá da salinha e põe a quinta sinfonia de Mahler, conduzida por Bernstein
E o seu pensamento voa




19 de novembro de 2008

ELOS





CHEMA MADOZ


De elos se formam as correntes, de correntes vive a humanidade, correntes que servem para nada e para tanto...
Correntes grossas, pesadas, que prendem mãos marcadas, torturadas, correntes que castigam, correntes que prendem um homem e uma mulher de maneira impossível, correntes insuportáveis que quebram o espírito de quem as suporta
correntes...
que ligam amigos de maneira forte, inquebráveis, correntes de amizade, correntes blogosféricas, que têm muito que se lhes diga, correntes de generosidade de qualquer um que queira fazer a diferença ajudando outros, tantos quantos as corrente consigam suportar
correntes...
de amor, de paixão, que podem vingar ou não, mas que enquanto duram trazem felicidade a quem as usufrui e quando acabam sempre trazem sofrimento, correntes que aprisionam, a quem não se importa de se sentir prisioneiro, mas que nem existem para quem é livre de se entregar ou não
correntes...
de vento, que empurram obrigando a andar, que viram chapéus de chuva deixando encharcado quem os usa, que correm para se abrigar, mas que também fazem dançar, rodopiar, os felizes
correntes...
de água, de rios calmos e aparazíveis, que escorrem para o mar, onde o sol bate deixando reflexos, onde nos debruçamos para carregar baterias, mas também correntes de água que escavam a terra levando-a para onde não é suposto, que alagam destruindo tudo e o pouco de quem nada tem
correntes...
que se podem quebrar, sempre que se queira e para isso se tenha vontade, correntes partidas que se podem juntar, nem que seja com uma turquez, só é preciso caprichar
correntes...
de ar... são das que mais gosto
há sempre quem diga – fecha a janela, que há uma corrente de ar –
não por mim, deixava as janelas todas abertas para provocar bastantes correntes de ar, frescas em dia de verão, geladas em pleno inverno, que talvez começassem por limpar a casa, mas de seguida iriam limpar outra, tiravam as teias de aranha, partiam para mais outra, de onde limpariam o pó e os restos de mágoas e mais outra, onde a limpeza seria mais profunda, limpando e renovando as vontades e os ideais, vendaval de correntes de ar por esse mundo fora, força tamanha capaz de o mundo modificar, limpando e revolvendo as mentes
correntes...
que não param, que sempre existem aqui ou além
correntes...


17 de novembro de 2008

A GAIOLA



CHEMA MADOZ



Há gaiolas e gaiolas.Não são douradas, mas há umas que parecem ser. As de porta aberta e as de porta fechada.
Esta está pendurada no ar e tem dentro, de porta fechada, uma nuvem pequenina.
É sempre bom ter uma nuvenzinha de estimação por perto, onde possamos deixar as frustrações do dia –a-dia. Quando a nuven já estiver bem cheia, bem pesada, abre-se a porta e deixa-se sair, porque ela, a nuvem, também precisa de se renovar.
Mas depois de ela partir, tem de se procurar uma outra, pequena e branca, que consiga arcar com a nossa vida, as partes menos agradáveis, a vontade que se teve de responder ao chefe, ou ao colega, a mentira que nos disseram, a sacanice que foi feita, mas para isso é necessário arte, porque uma nuvem não se deixa apanhar assim às primeiras.
Por isso pôe-se dentro da gaiola um chamariz, a que ela não consiga resisitir, sempre com atenção não vá aparecer uma nuvem maior que não caiba dentro da bonita gaiola.
Numa das grades prende-se um beijo com o qual se fez uma laçada com com uma lágrima de alegria e outra de tristeza. Para lhe dar um ar de graça, espeta-se na lágrima de tristeza uma gargalhada e um sorriso terno, por cima do beijo. Está quase pronto o chamariz, só falta um sopro de amor, para ficar irresistível para qualquer nuvem exigente que passe.
Ela aí vem airosa e bem disposta. Quando lá está dento da gaiola, muito brandamente, fecha-se a porta para não a assustar e fala-se com ela explicando-lhe como será importante durante uns tempos, que se querem longos, por ser sempre bom não ter de se usar muitas vezes.
A nuvem não se importa, porque percebe a necessidade que se tem dela, para a vida facilitar.
Uns tempos depois, com a prática, já não haverá necessidade de nenhuma nuvem, então deixaremos a gaiola pendurada no ar, de porta aberta e para não ficar completamente vazia, penduram-se nas grades, algo de que todos gostem
Um quilo de sorrisos leves, de todas as cores e formas, não esquecer também os brejeiros, que são sempre uma boa aposta para os que andam sempre inseguros; meio quilo de risos bem dispostos, para espalhar alegria de quem passa, uma mão cheia de gargalhadas, alegres e trocistas, altas e irresistíveis, de maneira a quem passe ser contagiado. Beijos soprados, leves como espuma das ondas , dos apaixonados também é bom não esquecer e beijos amigos, para lembrar a todos que esta gaiola é verdadeiramente dourada, por ter sempre a porta aberta. Amor, muito amor, desde o mendigo que passa até ao inimigo, que passa também a dizer mal baixinho.
E assim, simplesmente, se constroiem pequenas felicidades , para quem passa poder colher, neste mundo de miséria.
É fundamental não esquecer de repor, diariamente, a dose recomendada.

16 de novembro de 2008

QUASE



Autor que não consegui identificar




Um pouco mais de azul nos olhos visse
Faltou para que fosse madrugada
Talvez uma janela que se abrisse
Entre o beijo roubado e a mão dada

Despir aquela pele feita de Lua
Bordada de mil gestos e segredos
Abandonar a graça de estar nua
Ainda na saudade de outros dedos

Vestir de novo a pele do dia a dia
Arriscar um sorriso bem distante
Entre a indiferença e a ironia

Que nesse ritual de musa errante
Trazes por encanto ou por magia
De ti cativo o teu eterno amante



Poema de FERNANDO TAVARES RODRIGUES
In XXI Sonetos de Amor, ficheiro que me foi enviado por NONAS


14 de novembro de 2008

O MEU AMOR



TUAN



Ele é o vento que me empurra, é a chuva que me lava, é o trovão que me desperta,
porque nem sempre ando acordada
Ele é o raio que me deslumbra, o orvalho que me mata a sede, é a terra que me faz criar raízes
porque às vezes ando tão despegada
é o mar em que vogo, o barco que me baloiça, ele é o farol que me orienta
porque às vezes ando tão perdida
é o pão que como, o leite que me alimenta, o mel que me adoça
porque às vezes sou tão reguila
é o meu começo de dia, a luz que brilha através da janela, o sol que me aquece
porque às vezes me entra o frio
o calor da lareira, o tronco onde me sento, é o sofá onde me enrodilho
porque às vezes a tristeza invade
é a mão que me afaga a face, a boca que me beija, o corpo onde me escondo
porque às vezes preciso de mimo
é o colchão onde me deito, a manta que me acalenta, o beijo que me revigora
porque às vezes ando tão cansada
o corpo onde pouso, o peito onde me recosto, é o abraço que me aperta
porque tantas vezes preciso da sua força
é a almofada onde deito a cabeça cabeça, o lençol que me tapa, a mão que me destapa
porque é dele o meu coração
é a noite onde durmo, é o dia onde vivo, é a alegria e o segredo que guardo comigo
porque ele é o homem da minha vida.


13 de novembro de 2008

1966 - TÃO ACTUAL, HEIM?









D'abord il y a l'aîné
Lui qui est comme un melon
Lui qui a un gros nez
Lui qui sait plus son nom
Monsieur tellement qui boit
Ou tellement qu'il a bu
Qui fait rien de ses dix doigts

Mais lui qui n'en peut plus
Lui qui est complètement cuit
Et qui se prend pour le roi
Qui se saoule toutes les nuits
Avec du mauvais vin

Mais qu'on retrouve matin
Dans l'église qui roupilleRaide comme une saillie
Blanc comme un cierge de Pâques
Et puis qui balbutie
Et qui a l'œil qui divague
Faut vous dire
Monsieur

Que chez ces gens-là
On ne pense pas
Monsieur

On ne pense pas on prie
Et puis, il y a l'autre
Des carottes dans les cheveux
Qu'a jamais vu un peigne
Qu'est méchant comme une teigne

Même qu'il donnerait sa chemise
A des pauvres gens heureux
Qui a marié la Denise
Une fille de la ville
Enfin d'une autre ville
Et que c'est pas fini
Qui fait ses petites affaires

Avec son petit chapeau
Avec son petit manteau
Avec sa petite auto
Qu'aimerait bien avoir l'air
Mais qui n'a pas l'air du tout
Faut pas jouer les riches
Quand on n'a pas le sou
Faut vous dire
Monsieur

Que chez ces gens-là
On ne vit pas
Monsieur

On ne vit pas on triche
Et puis, il y a les autres
La mère qui ne dit rien
Ou bien n'importe quoi
Et du soir au matin
Sous sa belle gueule d'apôtre
Et dans son cadre en bois
Il y a la moustache du père

Qui est mort d'une glissade
Et qui regarde son troupeau
Bouffer la soupe froide
Et ça fait des grands flchss
Et ça fait des grands flchss
Et puis il y a la toute vieille
Qu'en finit pas de vibrer
Et qu'on attend qu'elle crève

Vu que c'est elle qu'a l'oseille
Et qu'on écoute même pas
Ce que ses pauvres mains racontent
Faut vous dire
Monsieur

Que chez ces gens-là
On ne cause pas
Monsieur

On ne cause pas on compte
Et puis et puis
Et puis il y a Frida
Qui est belle comme un soleil
Et qui m'aime pareil
Que moi j'aime Frida

Même qu'on se dit souvent
Qu'on aura une maison
Avec des tas de fenêtres
Avec presque pas de murs
Et qu'on vivra dedans
Et qu'il fera bon y être
Et que si c'est pas sûr

C'est quand même peut-être
Parce que les autres veulent pas
Parce que les autres veulent pas
Les autres ils disent comme ça
Qu'elle est trop belle pour moi
Que je suis tout juste bon
A égorger les chats

J'ai jamais tué de chats
Ou alors y a longtemps
Ou bien j'ai oublié
Ou ils sentaient pas bon

Enfin ils ne veulent pas
Parfois quand on se voit
Semblant que c'est pas exprès
Avec ses yeux mouillants

Elle dit qu'elle partira
Elle dit qu'elle me suivra
Alors pour un instant
Pour un instant seulement
Alors moi je la crois
Monsieur

Pour un instant
Pour un instant seulement
Parce que chez ces gens-là
Monsieur

On ne s'en va pas
On ne s'en va pas
Monsieur

On ne s'en va pas
Mais il est tard
Monsieur

Il faut que je rentre chez moi.

12 de novembro de 2008

A FOTOGRAFIA QUE NÃO FOI TIRADA







Sou uma nódoa com fotografias, mesmo com máquina digital. Não tenho hipótese, nem paciência para os permanentes fiascos.
Tenho pena que os fotógrafos não se lembrem de vir fotografar o lado de cá, desta Serra, há fotografias tiradas aqui do vale e em dias de nevoeiro, mas à noite com nevoeiro, ainda não vi.
Da minha janela vejo a Serra de Sintra, toda, tendo à frente as traseiras do Palácio da Pena e do lado esquerdo o Castelo dos Mouros que se espraia pelas escarpas abaixo. Visto d’aqui o Palácio parece estar lado a lado com o Castelo
Estão muito bem iluminados.
Uma destas noites, ao princípio da noite, por volta das sete e meia, fiquei a olhar fascinada como tantas e tantas vezes me acontece.
O Castelo dos Mouros com as suas sinuosas muralhas, que se desviam ora ali, ora mais além, das fluorescências graníticas integrando-as no seu espaço, via-se com uma bela nitidez.
A colina onde está o Palácio, aí a dois palmos de distância do Castelo, perfeitamente visível até se chegar à base da Pena que não se via, toda encoberta por nuvens de nevoeiro luminosas, que na zona do Palácio parecia braseiro bem vivo, subindo bem alto, deixando-se logo cair para o lado direito, as pontas já mais escuras, menos luminosas. Parecia o cair da cabeleira, quando uma mulher lhe mete dentro as mãos, levantando o cabelo e rapidamente as retira, enquanto abana a cabeça, deixando-o cair de jeito um pouco selvagem.
Não estava nenhum vento, nem aragem aqui no vale, mas o nevoeiro estava em dança meticulosa, um passo para a frente, dois para a direita, abrindo ligeiramente, o suficiente para se vislumbrar uma Pena fantasmagórica, um para a esquerda, cerrando completamente, subindo ainda mais um pouco, dois para trás, prometendo que iria abrir e em vez disso, deixando-se cair pelo lombo da Serra que vai ter a Colares, dois para a direita, um para a frente, abrindo, mais uma vez, mas tão pouco que o palácio parece feito da neblina e com um sopro desaparecerá e lá volta o nevoeiro cerrado, sempre e só sobre a Pena, vermelhos, amarelos e cinzentos.
Foi só quando ouvi - quando é que se janta? - que voltei a este mundo e dei por ter ficado ali, maravilhada, mais de uma hora.
De manhã, depois de subir até ao alto da aldeia, é um outro deslumbro. O nevoeiro começa a retirar da Serra e sobem da base fumos que nos dão a ideia de mil chaminés fumando. Vale a pena parar o carro e deixar que me atrase um pouco, para a assistir a essa fumarada que sobe pela Serra em línguas finas, até se perder já quase no cimo.
Que pena eu tenho de não haver fotografias destes e doutros deslumbramentos meus.


Esta fotografia é um pequeníssimo exemplo das "chaminés"



10 de novembro de 2008

HOMENAGEM A MIRIAM MAKEBA





Soube pela FATYLY que Miriam Makeba, morreu depois ter saído do palco, onde actuava em Itália, para apoiar um jornalista ameaçado de morte pela Máfia
Aqui fica cantando com Paul Simon no espectacular Graceland

TEMPESTADES



Velta Raios



Correu para a janela ainda a tempo de ver o raio a riscar o céu, mesmo por trás do castelo iluminando-o fantasmagoricamente, parecendo habitado.
Como ela gostava de trovoadas e de ver a sinuosidade dos raios. Gostava particularmente daquelas noites em que chovia tão intensamente que nada se conseguia vislumbrar através da janela. Às vezes, quando tinha sorte, juntava-se mais de uma tempestade e então a noite feérica transformava-a, sentindo-se repentinamente senhora das trevas, dos raios e do trovão.
A avó não gostava de a ver assim, percebendo vagamente que havia uma qualquer transformação nela, mas sem conseguir entender o que se passava no seu interior. Chamava-a para junto de si, ela obedecendo rapidamente por ter medo que a avó percebesse o que lhe ia dentro, apesar de só ter oito anos. Mas mal pressentia a chegada de mais um raio, corria apressada para a janela, ouvindo a avó perguntar o que se passava, ainda as palavras não estavam acabadas e já o raio fazia a sua aparição. A avó estremecia pensando que era do trovão, não querendo enfrentar que a neta sabia que o raio viria, antes de ele aparecer.
Nessa noite em que tinha havido três tempestades juntas, em que os raios e os trovões se sucediam, já não a arrancou mais da janela, ouvindo-a murmurar palavras ininteligíveis. Passou a noite em branco sem saber se haveria de contar à filha o que se passava com a neta. Já o dia rompia quando resolveu calar o que tinha acontecido, pensando que a criança tinha só oito anos e com o tempo aquele fascínio passaria, sem se lembrar que a maior parte das crianças daquela idade tinham medo de trovoadas.
Teria dez anos, quando junto à janela parecia orquestrar a trovoada, e não raras vezes a avó ficara com a sensação que a neta tinha conseguido chamar mais uma tempestade para se juntar à primeira. Vi-a rir enquanto parecia que as comandava.
Andava sobressaltada sem saber o que fazer e resolveu que nunca mais a levaria consigo nas férias de Natal e da Páscoa, visto em Lisboa as trovoadas serem raras.
Passaram-se os anos e parecia que Vera passara a ter um comportamento normal, no entender da avó. Casara, tivera um filho e quase apetecia dizer que vivera feliz para sempre, não fora ter a avó morrido e um mês depois o seu filho ter sofrido morte súbita.
A dor e a revolta desencadearam comportamentos estranhos, tão depressa ria parecendo louca, como começava a murmurar palavras ininteligíveis que ninguém a ouvira dizer antes, a não ser a avó que já não estava presente.
Certa vez foi para a varanda onde passou a noite e quem tivesse espreitado teria-a visto a fazer gestos como quem está a dirigir uma orquestra, mas depois de várias horas naquelas tentativas, teria reparado que tinha feito, por duas vezes, surgir pequenos raios, que nem tinham provocado trovões audíveis.
Desde essa noite parecera que tinha serenado.
O marido não sabendo lidar com os estranhos comportamentos, um ano depois da morte do filho, fora-se embora. Agora estava por sua conta e risco e com toda a liberdade de poder passar noites inteiras a treinar ritos e rezas, fazendo surgir com frequência raios cada vez maiores. Dominava bem aquela arte, assumindo por completo ser senhora das trevas, dos raios e do trovão.
Um dia, em Lisboa, só se falava de uma tempestade aparecida do nada, sem ninguém conseguir explicar o fenómeno, nem os meteorologistas que diziam que-havia-condições-atmosféricas-que-se-conjugavam-repentinamente-para…. blá,blá,blá.
O certo, é que alguém a terá visto e estranhado, porque passado pouco tempo, já toda a gente, no bairro em que vivia, murmurava quando a via passar e fazendo um esforço auditivo, no meio dos murmúrios percebiam-se palavras como feiticeira e mesmo bruxa.
Mudara-se e fora viver para perto de uma aldeia, numa zona descampada. Desde que ali vivia, as tempestades eram constantes, tanto de inverno como de verão, dependendo o seu tamanho do nervosismo ou do humor que Vera tivesse naquele dia ou noite. Estava a atingir a perfeição no que dizia respeito a dominar os raios e trovões, mas a inquietação era cada vez maior.
Não se sabe como, chegou aos ouvidos de alguém da aldeia o que se tinha passado em Lisboa. Os aldeões, pessoas de paz, que viviam do que a terra dava, atemorizaram-se, por lhes estar a dar grandes prejuízos, aquelas tempestades, sem tom nem som, que sempre eram acompanhadas por grandes chuvadas. Combinaram então ir falar com Vera, de quem todos gostavam.
No fim de uma tarde, já ao lusco-fusco, em pleno verão, aproximaram-se da sua casa e viram-na cá fora em pleno campo, fazendo aparecer o primeiro raio seguido de forte trovão.
Vera viu-os e correu para casa, onde se fechou sempre dominando a tempestade que se tornava mais forte a cada momento. Passado um pouco voltou para campo aberto e levantando os braços à tempestade, gritou imperiosa uma ordem
um raio desceu brandamente sobre ela, o seu grito confundindo-se com o som de um trovão


9 de novembro de 2008

CUPIDO



Cupido por Edvard Munch



Na tua boca que é a sede dos meus dedos
Nos teus olhos cor de cobre incendiado
Revelas um a um os teus segredos
Num convite mudo antecipado

E já no teu sorriso se entendia
Que dentro desse corpo de rainha
Se escondia a secreta fantasia
De espadas e de beijos ser bainha

Que pode um homem só enfeitiçado
Na magia do corpo oferecido
Senão oferecer-lhe o seu reinado

Guerreiro noutras guerras ja ferido
Jaz agora de setas trespassado
Por cupido de amor desiludido

Poema de FERNANDO TAVARES RODRIGUES
In XXI Sonetos de Amor, ficheiro que me foi enviado por NONAS

7 de novembro de 2008

PARA TI, JOSÉ






O JOSÉ, mandou-me este video.
O que tu não sabes é que no meu anterior blog, já uma vez tinha dito que não havia nenhum Aleluia que não me comovesse até às lágrimas.
Apesar de ser um Agnus Dei, tem a alegria de um Aleluia.
Não há nada como a música para criar Misticismo
Não podia deixar de o pôr aqui.
Encham o écran com esta maravilha.
Obrigado José



PERDIDOS



Carlos Afonso






Tinha ido á Chamusca espreitar o rio, tão largo naquele sítio, tão cheio naquele inverno, olhando admirada, fascinada, as marcas que ele lhe mostrava, dizendo com ares sabedores, que aquela cheia não era nada, que visse bem as marcas mais acima, que eram de anos anteriores, que isso sim tinham sido cheias que a terra tinham deixado prenha
Pegando-lhe na mão puxou-a para a levar a andar de barco, amarrado ao pequeno cais, que lhe ia mostrar a força daquele rio quando cheio, que nada tinha a ver com a acalmia de que ela tanto tinha gostado no ano anterior, quando lá fora no verão.
Ela com medo, deixou-se levar por tanto nele confiar, no seu amor de rapariga.
De barco a levou para o meio do rio, onde a força da corrente, tão grande como o seu amor, os levava, sem ser necessário remar, a uma velocidade impressionante, ela sem poder o rio admirar, atemorizada por aquela enchente que não sabia se de amor era ou da corrente.
Quando quiseram voltar, já depois de ele lhe ter confessado que também lhe queria, tanto como o rio lhe dizia, foi necessário toda a sua concentração, com ela ao lado, impulsionando os remos, cada um no seu, ele abrandando a sua força, para compensar a dela mais fraca, para conseguirem chegar ao pequeno cais que os aguardava, dando-lhes a segurança que a meio lhes tinha faltado, já os dois bem estafados, arfando sem bem saberem se era do amor que os consumia, se do esforço que tinham feito, os dois lado a lado, sorrindo satisfeitos por tão bem terem emparelhado.
Estava a recordar esses momentos, sem saber o que tinha acontecido a meio do caminho, agora tantas vezes de costas voltados, cada um remando o seu barco, sem conseguirem voltar àquele cais que tantas vezes os tinha aguardado, dando-lhes a segurança que às vezes lhes faltava, a corrente puxando com força por cada um
Ele remando para um lado, ela para outro, às vezes lado a lado, para logo de seguida percorrerem desfasados o seu caminho, mais doloroso feito sozinho, sem o outro se aperceber que cada vez era mais difícil encontrarem-se, nem que fosse na chegada conjunta ao cais.
Ainda tinham feito um esforço, lembrando-se de como se queriam, de como eram completos quando estavam juntos, se ele tinha sido o rio, ela tinha sido a enchente, se ele tinha sido o barco, ela tinha sido o remo, se ele tinha sido o penhasco, ela tinha sido o farol, mas a corrente era cada vez mais forte e como estavam em barcos separados, não conseguiam remar com idênticas forças, desviando-se cada vez mais um do outro
agora dentro de um mar desconhecido, sem penhasco, sem farol encontravam-se sem se reconhecerem, perdidos para o rio
perdidos para eles
perdidos

6 de novembro de 2008

QUE TAL UMA IDA AO TEATRO?




Proposta do A VOZ PORTALEGRENSE, que tem o programa completo.
porque não ir um destes dias ao teatro?








«As pessoas têm a mania que são donas de cães, de canários, de outras pessoas, de casas, e até da própria terra. Ponhamos os cães e os canários de lado, e vejamos como é que se comportam as pessoas com as casas. Depois a história é simples: a porteira trabalha para a madrasta e depois vem o príncipe, que é mais poderoso, expropria a madrasta e fica com a porteira. Mas como é que é depois da felicidade para sempre? Como é que são as histórias depois de acabarem as histórias?»
[Miguel Castro Caldas]

5 de novembro de 2008

SONHAR OU VIVER



Claude Théberge




Maria fita mais uma vez o caminho que se entrecruza em tantos
Fica zonza só de olhar para um e outro lado e, mais uma vez, de outro para um dos caminhos, não esquecendo os do meio que se abrem em milhares, cruzando-se um pouco mais à frente com mais umas centenas deles e pensa que gostava de ter umas asas para os poder ver de cima e verificar que padrões formam. Encontra outros tão zonzos como ela, nessa procura sem fim e afasta-se, porque é no silêncio e no isolamento que se encontram respostas
Pelos padrões seria mais fácil escolher, se os conseguisse identificar....
Lembra-se com pena que já perdeu as asas, que só se têm enquanto somos crianças.
Relembra o que aprendeu e pensa que poderá estar a viver um sonho, o melhor será ficar quieta à espera de acordar, sem fazer opções cansativas, de ir de um para o outro lado e ter de voltar para trás para tudo recomeçar
Já nem se lembra das vezes que tudo recomeçou para vir sempre dar ao mesmo local, círculo vicioso de onde não consegue sair
caminhos largos e sinuosos ou estreitos e que sinuosos são.
O padrão! O padrão é a sinuosidade, sempre para dificultar, se não poderiam ser ao menos mais direitos, para se poder ver mais ao longe, ela que gosta de horizontes bem largos e de poder espraiar o olhar
Começa por andar de volta, talvez possa não ter de entrar em todas aquelas bifurcações. O caminho será mais longo mas muito mais fácil, já está farta de complicações.
Mas a meio, pensa que será a meio, encontra o que tinha medo fosse acontecer, uma barreira alto e no cimo adivinha, estarão várias das bifurcações das quais ela deveria ao menos ter escolhido uma.
Volta para trás, zangada consigo, pensando que sempre detestou desmanchar o que quer que fosse, e este caminho assim feito, parece os pontos de um bordado que passa a vida a desmanchar.
Maria odeia bordados
Estaca zero, parecendo que nem passado já teve, só tem de escolher o futuro
exatamente! o futuro depende de uma escolha
não a vai fazer para já
Já nem sabe se é a vida que está em causa ou se são só sonhos e simplificaria ao menos saber o que se passa.
Sonhos....sempre sonhou tanto e tão bem. Serviu-lhe de pouco e de muito, quantas vezes não os soube pôr em prática, quantas vezes foram mal aplicados, quantas vezes...
eram tão belos os seus sonhos...quimeras tão difíceis de atingir, mas tão belos, sem eles nunca teria sobrevivido
O caminho não se faz de sonhos, decide,
o caminho faz-se caminhando, optando entre veredas, tendo sonhos no horizonte. Descobre finalmente, que tem de simplificar, é uma das suas características, irá também escolhendo o sonho que terá no horizonte, os mais fáceis primeiro para os conseguir atingir e para mais tarde os mais difíceis, que com o treino passarão a ser também fáceis e assim serão todos atingidos, deixando para o fim o mais belo, porque gostaria tanto de viver aquele em que tantas vezes tem pensado.


3 de novembro de 2008

DESTINOS?




Paulo Medeiros



Vêem-se ao longe duas figuras naquele imenso areal deserto a essa hora da madrugada. Uma mulher idosa que avança determinada com uma criança pela mão, que salta e brinca ao seu lado. Chegada a um local já anteriormente escolhido, onde está um tronco que parece trazido pela maré, pára e puxa a criança para mais perto de si, inclina-se e fala com ela que a ouve com atenção.
É dia de solstício

Vêem-se ao longe duas silhuetas naquele imenso areal deserto àquela hora da madrugada. Uma já bastante curvada, a outra, pelo andar, é uma jovem mulher, avançando lado a lado, parecendo que se dirigem para o mesmo local onde continua o mesmo tronco, de há tantos anos atrás e ali chegadas param.
Amélia está ali, mais uma vez, ajoelhada, com gestos sempre iguais, gestos que se perdem na memória dos tempos, pondo as mãos em concha e sorvendo o ar que contêm, como de algum líquido druida se tratasse. A mais jovem, um pouco de lado, fica em pé olhando o horizonte.
Amélia ali está como de costume, naquele dia especial, cheia de uma determinação que reconhece, impregnada de uma força estranha, olhando agora o céu que se torna rubro e dourado, levanta os braços ao céu e de seguida escava a areia soprando para dentro do buraco acabado de fazer, o mesmo ar que acabou de sorver, cospe para dentro dele, tampando-o em seguida com cuidado, para que fique preso durante todo esse ano, enquanto faz rezas, que não quer ouvir, com finalidade que não quer conhecer.
Amélia vira-se para ela, como sempre fez, inclinando a cabeça, para lhe dar a conhecer que o ritual estava acabado. Olha a jovem mulher perguntando-lhe se a memória a ajuda a reconhecer o local certo e se saberá repetir todos os gestos que viu tantas vezes fazer enquanto criança, por ter chegado a hora de ser herdeira dessa sabedoria ancestral.
Sorri divertida. Se Amélia soubesse o horror que tem aos rituais, perceberia que estava profundamente enganada e que nunca aceitará ser herdeira daquela sabedoria, não quer fazer parte de nada que não entenda, não quer fazer parte de rituais e muito menos cuspir ou andar assoprar para dentro de covas feitas na areia.
Olha-a de soslaio e diz-lhe que faz mal em não acreditar por estarem já, desde que nasceu, os astros conjugados para ser ela assumir o que outros fazem com tanto cuidado.
Percebe que Amélia está a falar do que pensou sem ter verbalizado e sente um arrepio de medo.
Amélia ri-se, como se ela fosse parva, mas vê o seu ar sério, preocupado e acrescenta, docemente, que não está nas suas mãos poder alterar o destino, que está escrito e com os seus 25 anos é tempo de aceitar o que há muito recusa.
A resposta sai agreste. Pode sempre alterar o destino, quer lá saber do que está escrito. É bom que Amélia acredite, que jamais fará parte de sopros de rituais e de covas. Mal disse covas, percebe que usou a palavra errada, covas haverá sempre na sua vida ou na sua morte.
Sem saber porquê sente uma ameaça no ar, mas pergunta, mais agreste ainda, se Amélia sabe porque há tantos anos a não acompanha, se percebe o asco que tudo aquilo lhe faz, se sente que toda ela se rebela contra esses rituais que não percebe nem quer perceber, se alguma vez entendeu a repugnância que tem por tudo, tão pouco, que viu durante a infância.
Amélia olha-a bem de frente e responde que sabe de tudo isso, mas que chegou a hora de ela deixar a recusa, é tempo de assumir o destino.
Toda ela vibra na recusa e diz um não veemente.
O olhar de Amélia é aquoso de tanta ternura. Lembra-se bem da reação que teve, já lá vão tantos anos, mas percebe que com ela a recusa é maior, mais determinada e que nestes tempos os rituais parecem mais estranhos. A ternura escorre atingindo-a, mas com raiva sacode-a e Amélia sem alternativa avisa-a para ter cuidado com o que fará da sua vida, que não recuse o seu destino, ou o destino poderá vir a vingar-se.
Palavras ameaçadoras que ficaram a pairar……
Frente à cova onde Amélia foi enterrada, no ano seguinte, sentiu que covas era o que haveria mais na sua vida até chegar à sua, mas resistiu sabendo que o destino estava nas suas mãos, sabendo que há uma reação a toda a opção, assumindo, mesmo assim, que seria ela a escolher a reação.
Tanta cova que encontrou na sua curta vida! Tantas covas que teve à sua frente, algumas delas tão dolorosas. Quando percebe que está chegado o tempo de encontrar a sua, parte calmamente sabendo que foi sua a escolha, que conseguiu dar a volta ao seu destino
ouve, então, uma gargalhada forte, trocista e longínqua, que acompanha o seu último suspiro.



2 de novembro de 2008

CLARIDADE



Elena & Vitaly Vasilieva



Quando bebo de manhã a claridade
Da ternura que resta no teu peito
Festejo o encanto e a vaidade
De ter-te nua ainda no meu leito

Quando te toco os flancos a aventura
De ler na tua pele nossos enredos
Recordo da tua boca essa loucura
Que mordeu com ternura os meus segredos

Quero-te assim amor como se fosse
De todos os meus sonhos o mais doce
Um ramo de flores todos os dias

E o tanto que te quero e me querias
Só as palavras roucas que dizias
Na taça de cristal que o Amor nos trouxe




Poema de FERNANDO TAVARES RODRIGUES
In XXI Sonetos de Amor, ficheiro que me foi enviado por NONAS