Resolveu que tinha de construir uma ponte, ou mais, sabe lá, ela que gosta tanto de pontes, que as olha sempre fascinada mas que está farta de usar as pontes que outros construíram e que só a levam a locais de onde quer regressar, margens que dela não são e que está tão farta
Seria mais fácil, talvez, voltar a um tempo primordial onde as tivesse que construir, se quisesse sair de onde está.
Assim pensando vai passeando pela floresta que bem conhece, tantas vezes já trilhada, saltando ali por cima de um tronco, resvalando acolá no musgo húmido deste dia de nevoeiro intenso, fechado, onde a luz chega mal e filtrada, coração pesado sem saber a razão, deixando de pensar na ponte que quer construir, para fixar a atenção no caminho que vai pisando, apetecendo-lhe dar pontapés nas pedras que vai achando pelo caminho triste, molhado, escorregadio, mas que a sua teimosia a faz percorrer, infiltrando-se cada vez mais, já em lugares nunca visitados, insistindo obsessivamente, com vontade de se perder, de nunca mais se achar num mundo que lhe vai fechando a retaguarda sem lhe abrir horizontes, escorregando, quase caindo, alma apertada, pequena, palavrão na ponta da língua, raios que agora caiu mesmo, encharcada, pondo-se em pé com má vontade, dizendo para si que à próxima se deixa ficar ali prostrada, prostrada era uma solução, depor as armas, desistir da luta, ficar ali fechada e agora foi um ramo que não viu que a escalavrou toda, afasta mais um ramo, que pouça de caminho é aquele como terá ali chegado, é o dia que a faz estar assim e daí talvez não, já não quer saber a razão de coisa nenhuma e resvala mais uma vez deixando-se ir, sem se agarrar a nada, lembra-se então do prazer dos escorregas da infância de como era fácil subir uma e outra vez e deixar-se escorregar por aquele declive abaixo que parecia que não tinha fim, vem-lhe á memória o olhar e o sorriso de felicidade que lhe aparecia no rosto, como se o mundo fosse só dela e devagar devagarinho volta a aparecer-lhe no rosto esse mesmo sorriso, agora de ternura para quem foi.
Está sentada no chão e tudo lhe parece diferente, olhando á sua volta vê uma ponte que não foi feita por ninguém, feita só pela natureza e ergue-se mais uma vez, por se sentir desafiada, já lhe baila um sorriso de felicidade, só de pensar que vai atravessar aquela ponte pé ante pé, com cuidado para não cair porque desta o tombo será sério, um pé de cada vez, braços no ar para se equilibrar.
Quando chega a meio, só quando chega a meio, o nevoeiro começa a abrir deixando passar uma luminosidade que a encanta, parecendo a abertura de uma gruta e só nessa altura percebe que tem onde se agarrar e fica ali fascinada, percebendo que finalmente encontrou a sua ponte, que a irá levar para onde quiser. Deixa-se ficar mais um pouco, a interiorizar aquela luz, sabendo já que se vai deixar escorregar pelo ramo que está ali mesmo ao lado e seguir em frente.
ucraniana CCLXX - Santos Silva, ¿por qué no te callas?
Há 14 minutos
26 comentários:
Linda a imagem e o texto ainda melhor, deixando no ar um tanto de melancolia, ou de solidão, apesar da ternura e do sorriso, apesar de ter encontrado o seu pretendido...um abraço na alma
Salvé, ó margem desse lado!
O Caminho é assim, como o descrito; talvez menos "corrido"... - dentro dessa panorâmica de síntese.
Ficar quieta...até que o nevoeiro se espalhe é algo sensato.
Dar atenção...quando o terreno é escorregadio, é prudente.
Entrar em silêncio...quando a vontade é detonar as palavras - precipitando vibrações desafinadas - há que ter maior contensão.
Sabe-se que trabalhar as emoções que os acontecimentos proporcionam, é o pior dos estágios.
Mas nada é fácil! - E nunca ninguém disse que o seria...
Ter controle de si, é saber manter rédea curta, perante algumas das maiores "forças contrárias" contidas desde há milhares de vidas - quer em hábitos, vícios, e outras vontades do ego.
Se não houvessem pontes, bem alicerçadas, como se passaria para as outras margens?! e quem se atreveria, a vestir a pele de herói?!
Se não houvessem ramos firmes, onde se buscariam apoios?! - até não mais serem necessários...até se achar o FIO de PRUMO, que sempre existiu - daí os sorrisos que se vão esboçando pelo caminho.
Que hajam sim, pontes e mais pontes e ainda tantas passagens, quantas os que delas necessitarem - por exaustos, perdidos ou já sem esperança... - que não é o caso.
Que o trabalho então se veja e a obra nasça!
Lanço daqui um galho, que...
pode até dobrar...mas não parte!
Sempre...Mariz
Obrigado pelas palavras, belas convicções!
A única ponte que nos leva para onde quisermos ir é a sabedoria aliada ao amor.
Abraços
aurasacrafames.blogspot.com
Que bom perder-me na tua companhia...
Embrenhei-me na tua floresta, por lá me perdi, tal como me perco na minha. Reencontro-me em clareiras, olho para o céu, a luz que penetra aquece-me os sonhos gelados, ilumina-me o caminho interior, acalma-me as ansiedades, adormece os meus medos... acordo menos só, enquanto dormia pontes foram construidas, lobos maus levaram uns brutos duns sopapos e tudo ficou mais calmo e azul.
obrigada minuxa bom fim de semana
Olá,
gostei deste momento.
A vida é uma panóplia de pontes que temos que transpor.
bjs
Olá Elcio
Também gostei tanto da imagem!
Ontem esteve mesmo nevoeiro cerrado aqui pela minha casa
beijinho
Uma bela narrativa e não será a vida uma constante contrução de pontes? enubladas ou não...gostei imenso!
A foto é lindissima e ontem esteve um dia cerrado de nevoeiro que não se via um palmo à frente do nariz:)
Beijos e bom fim de semana
PS: desculpa lá linda, mas cadê a Roxanne? foi-se com o nevoeiro?:) ou não aceitou o trabalho?
Passar pontes... a toda a hora, com maior ou menor perigo, conforme a protecção da ponte ou o caudal do rio...
Gostei desta travessia.
Um beijo,Maria A. da Silva
Olá Mariz
Obrigado pelo galho. Sei que não partirá e faço tenções de me usar dele.
Beijinho
Lindo texto...
Olá Aura Sacra
Bem-vinda!
É como penso. O'conhecimento' também faz parte do crescimento, evidentemente, desde que se entenda esse 'conhecimento' como sentir.
Beijinho
Olá Inês
Sabia que me ias entender, tu mais do que ninguém.
beijinho
Olá Valentim
Disso não há dúvidas.
beijinhos
Olá Fatyly
Vou recomeçar com a Roxanne
risos
já és a terceira pessoa que me dá na cabeça.
Mas estes dois meses foram um turbilhão.
Beijinho
Olá Lucy
Aparecem de todo o lado os perigos.
às vezes é mesmo necessário construir pontes.
Beijinho
Olá Dennys
Bem Vindo.
20 anos dá para ter aprendido muito, ou nada....
mas 40 anos dá precisamente para a mesma coisa, ou 70.
Tudo depende da pessoa.
Obrigado por teres gostado.
beijinhos
Amiga:
Venho entregar-te 2 prémios:
1º - dardos
2º - Beautiful Blogger
Com abraço de sempre..
Mariz
sorriso
Obrigado Mariz,
O Dardos já és a terceira ou quarta blogger que mo dá
O Beatifull blogger é a primeira vez que o recebo.
Obrigado
Beijinho, Sempre
Querida Minucha, interpreto a ponte de que falas, nesta quase fábula, como a nossa razão de viver, ou o sonho/objectivo que nos propomos alcançar, ou até mesmo como o perceber porque estamos aqui e o que temos de aprender/superar nesta existência. Que felicidade quando se encontra qualquer uma destas pontes para nós!
Um grande beijinho e continuação de um bom fds :-)
... ainda há quem diga que a amizade virtual não é boa... é boa e até muito...
Olá Helena
Tu também me entendes na perfeição, minha querida
um beijinho
Olá Inês
também sempre achei que era
....mas ...isso traz< água no bico, não?
já´lá vou dar uma espreitada.
beijinho
... não , tudo o que pudesse trazer de água e de bico, não era aqui do meu blogue, ... nem do mundo virtual, era do outro mundo!
Daquele mundo que nos quer virar do avesso e tirar do sério...
Nesta minha 1ª visita, posso dizer que gostei do que vi e li.
Bjs
Ah! Mas desse mundo Inês, há-de mesmo virarnos ao contrário.
Não temos outro remédio.
beijinho
Olá Vieira Calado
Bem Vindo!
Obrigado
beijinhos
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