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31 de outubro de 2008

COISAS DA CHUVA



JAN DEICHNER


Maria Augusta gostava de sol, gostava da vida, da vida transparente que se podia reflectir em tons de todas as cores
mas gostava também da chuva, do cheiro a terra molhada que a preenchia dessa certeza de continuidade desse planeta tão belo e tão azul
chovia, chovia e ela aproveitava e ia até lá fora para receber essa dádiva que era poder brincar enquanto a água caía, por gostar tanto de patinhar, ficou-lhe da infância quando era tão proibido aparecer molhada em casa.
Andava sempre com chapéu-de-chuva, tinha-o inclusive no carro. Passava lá o ano inteiro, no banco de trás, todas as estações do ano, mas quando chegava a altura de o usar, ainda o tirava para fora, passeando-se com ele no braço enquanto deixava a chuva cair em cima de si, cara voltada paras os céus, apanhando os pingos de sorriso aberto e feliz.
Alguns deviam pensar que não era boa da cabeça, que se tinha passado, mas sentia sempre uma alegria intensa e nem queria saber se a chuva era forte ou não.
Só não gostava da ventania, excepção feita quando estava em casa e a ouvia aconchegada junto á lareira, então aí tornava a ser feliz.
No meio de toda esta alegria e felicidade havia uma incoerência.
Quando via a chuva a escorrer pelos vidros da janela, qualquer janela em qualquer sítio, quando as gotas parecem lágrimas que lambem o vidro, não se conseguia conter e as lágrimas escorriam-lhe contínuas pelas faces.
Sempre que lhe perguntávamos o que se passava com ela, encolhia os ombros e continuava com as tarefas que tinha entre mãos. As lágrimas continuando a escorrer com a mesma lentidão que as gotas da chuva lambendo os vidros
Tornava-se lenta, numa transformação que sempre nos apanhava desprevenidos, porque se chovesse e as gotas não escorressem pelos vidros da sua janela, nada se passava, aliás até era raro acontecer, visto o gabinete dela, não sei se de propósito ou por pura casualidade, estar virado para o lado em que era raro o vento empurrar a chuva até aos vidros.
A explicação que dava quando conseguia falar é que lhe entrava uma tal tristeza dentro, sem saber como nem porquê, como uma enxurrada que tudo leva à sua frente, até lhe chegarem as lágrimas que não conseguia reter. Sentia uma tal infelicidade....
Num dia em que mais uma vez me tentava explicar o fenómeno, acrescentou baixinho
- ainda bem que isto nunca acontece quando estou sozinha, porque não sei o que faria....
Foi como se tivesse havido uma ameaça, dormente, silenciosa, profunda, parecida com o som distante, baixo, lento e rouco de um trovão. Estremeci, olhei-a de frente e perguntei-lhe o que queria dizer com aquela frase
Ela encolheu os ombros e disse – nada de especial – Agarrei-a pelos ombros
- nada de especial, não Maria Augusta. Desculpa lá, mas isso não é explicação para o que ouvi. Diz lá o que se passa contigo, eu ajudo-te, sabes que sou tua amiga
- não se passa nada. Que queres que te diga? Acontece-me desde há uns anos. Choro sempre que vejo a chuva a bater nas janelas, mas não sei porquê e nem te atrevas em falar em psiquiatras ou psicólogos. Acontece duas ou três vezes por ano, se tanto...não pode ser a minha maneira de limpar tanta porcaria que vemos por aí?
- mas porque disseste aquela frase?
- porque sinto uma infelicidade imensa, sem saber de onde vem, como se sempre ali estivesse, como se nunca me tivesse deixado, como fizesse parte integrante de mim e eu andasse a fingir que sou feliz, ou alegre ou sei lá o quê e durante aqueles momentos não sei quem sou, não me reconheço e tenho medo, mesmo pavor, que essa infelicidade vença e fique para sempre
Abracei-a, sem saber o que lhe dizer
Maria Augusta morreu há três anos, de doença. Um dia que estava com ela no hospital, a chuva batia na janela, ela olhava-a sem chorar, olhou-a durante muito tempo, até me dizer baixinho que a infelicidade sempre tinha morado nela
ela só a tinha tentado espantar



29 de outubro de 2008

A CAMISA



Tom Ford




7º JOGO DAS 12 PALAVRAS DO EREMITÉRIO


Ela ali estava, diziam que debotada, mas linda, talvez mais bonita ainda do que quando era nova. Era necessário, talvez apreciar-lhe o estilo. Dengosa, rosada mas tendo ainda e sempre o verde da esperança.
GALANTEIOS foi o que mais ouviu quando era nova, agora….muitas vezes, FALAZ o que se entretinham a dizer sobre ela.
Era dele, homem elegante, BAILARINO que tantas vezes dançara com ela, apreciando a LIBERDADE que lhe concedia no GESTO sempre impecável, dançando com ela em completa SINTONIA.
Quando a tinha, parecia que dela irradiava LUZ, por o SENTIMENTO que nos outros causava ser de admiração e o seu ego enchia, olhava-a, revirava os olhos para melhor a mirar e não poucas vezes ao passar por um espelho espreitava o efeito que faziam, os dois juntos, na assistência.
Como lhe diziam que sempre com ela andava, resolveu fazer uma pausa e por uns largos tempos pusera-a de lado, pensando que quando de novo com ela aparecesse, o efeito seria devastador em quantos os olhassem, principalmente pela HARMONIA que existia entre os dois.
Quando a fora buscar e para ela olhara entrara repentinamente em túnel de ESCURIDÃO. Fora com ESFORÇO que para ela olhara uma segunda vez, como para se certificar que era a mesma. Debotada!
Zangado, com ela na mão, fora confrontar a mulher. A CAPITULAÇÃO fora rápida: sim, era verdade, por engano metera a camisa na lixívia.
Ela por já não estar tão bonita, no entendimento dele, sofreu com a rejeição e passou a ficar em casa, arrumada junto com os trastes

28 de outubro de 2008

22 OLHARES SOBRE 12 PALAVRAS



HÁ UM LIVRO QUE VAI SER LANÇADO COM TEXTOS DOS PRIMEIROS JOGOS DE 12 PALAVRAS







Colectivo a apresentar: "22 Olhares Sobre 12 Palavras" (PVP: 13,00€) - nascido na blogosfera por pessoas que têm em comum o amor à palavra e à escrita.
Apresentações: _ Porto, Palacete dos Viscondes de Balsemão; à Praça Carlos Alberto, 22 Novembro, 2008, 16H - apresentação a cargo de Jorge Castro do Blog http://sete-mares.blogspot.com/ com prefácio de José António Brreiros _ ver blogues em http://joseantoniobarreiros.blogspot.com/ _ Lisboa: Livraria Barata, 05 de Dezembro 2008, 19H30

27 de outubro de 2008

BAILARINA



Isadora Duncan




7º JOGO DAS 12 PALAVRAS DO EREMITÉRIO



Estava-se em quarto crescente e nesse crepúsculo a lua, um delgado e fino sorriso de uma boca feliz, descia direita ao mar. Quanto mais próximo estava de o tocar, mais alaranjada ia ficando, até por fim parecer que o tinha tocado, ou seria o mar que apaixonado subia para a agarrar.
Ela estava sentada na areia, os braços rodeando os joelhos, já o crepúsculo ficara para trás, enquanto admirava o pôr-da-lua. Foi ficando. O encanto no coração, em SINTONIA com a noite, deixou a ESCURIDÃO escorrer por ela isolando-a nas suas memórias.

Trabalhava oito horas por dia agarrada à barra, forçando a mente para conseguir dominar o corpo, num ESFORÇO continuadamente suado, exigindo-lhe o desenho correcto do gesto no espaço, a sensação de leveza dada pela tensão de todo o corpo que vibra, para partilhar com quem a via aquela sensação de facilidade que só dá quem chega à perfeição.
Estava no centro do palco, treinando, treinando, insatisfeita consigo por nesse dia não conseguir obrigar a mente a concentrar-se, prejudicando assim o seu trabalho quando o bailado estreava dali a 15 dias e ainda tinha tanto a exigir ao seu corpo, para conseguir fazer com a arte habitual o seu papel de primeira BAILARINA.
Tão depressa ali estava, como o seu pensamento voava em perfeita LIBERDADE para aquele pedido que a fazia sonhar. Repreendia-se de imediato, mas dali a um pouco lá estava ela embrenhada no abraço, daquele outro corpo que admirava a HARMONIA do seu.
Com o primeiro GALANTEIO que lhe fizera, na corrida dos agradecimentos, voltara a cabeça para saber a quem pertencia essa voz que a arrepiara. O primeiro beijo fora dado há uns meses atrás. Era forte o SENTIMENTO que os unia. Agora aquele pedido!
Tinha de se concentrar, tinha de se concentrar no movimento de todo o corpo entre o acabar da pirueta e o salto que ia dar para os braços do seu par. Era difícil esse salto, teria de contrariar o movimento em plena pirueta e aproveitar a energia dela para se lançar no salto, que ainda lhe não saíra perfeito. O seu par resmungava, por já tantas vezes terem ensaiado sem resultado aparente.
O ESFORÇO enorme que fez valeu a pena, como sempre e a estreia foi um sucesso. O bailado ia ficar em palco durante oito dias e tinham combinado casar-se logo de seguida, por ela partir em tournée.
Acesas as luzes, para os agradecimentos, só reparava na LUZ daqueles olhos que não se despregavam dela.
Ao acordar nessa manhã em casa dele, na véspera do casamento, espreguiçou-se feliz pensando no dia seguinte. Ele abraçou-a com amor e avisou-a de que tinham de ter uma conversa séria, já que no dia seguinte casavam.
FALAZ conversa! Ou seria o pedido de casamento que tinha sido falacioso? Sentia-se traída.
As alternativas que lhe dava, três, não poderiam nunca estar em questão. Era a sua profissão!
Ou deixava de dançar, ou trocava de par, ou deixava de dançar bailados românticos, dizia, acrescentando que não a conseguia ver entre os braços de outro homem, principalmente os do seu par de sempre.
Parva que tinha sido! Sempre o soubera ciumento e achava-lhe graça….Mas a sua profissão?
Então, sem lhe responder, com um desgosto imenso, coração desfeito, olhos marejados de lágrimas, dera-se a sua própria CAPITULAÇÃO. Vestiu-se e foi-se embora, fechando a porta de mansinho.
Ah! A vida trocara-lhe as voltas. Sorria quando assim pensava, porque bem sabia que tinha sido a falta de concentração a trocar-lhe as voltas e não a vida.
Em plena tournée e em pleno desgosto, desconcentrara-se num salto e fizera uma má recepção ao solo, partindo o tornozelo. Valera ter sido num ensaio. Sabia que seriam meses, e que nunca mais poderia dançar, ou pelo menos ter como profissão ser bailarina.
Chorara de dor, chorara de revolta por não poder continuar a dançar, chorara por ter ficado sem nada
A lua tinha desaparecido há umas duas horas e ela ali estava sentada na areia, o tornozelo ainda a dar sinais, um ano já passado, a reviver esses dois momentos dolorosos da sua vida, mas as lágrimas tinham já ficado para trás e sabia o que ia fazer num futuro próximo.

26 de outubro de 2008

CEPTRO



Luis Royo



E o centro do teu corpo que me atrai
O centro desse centro que procuro
E é no centro de ti que a noite cai
Quando te dou o ceptro a arder no escuro

Não há mais veus suspensos nos teus dedos
Nem pedras cintilantes na cintura
Nem restos de palavras nos segredos
No teu altar de seda e de ternura

Mas ser mulher amor é mesmo assim
É ser fulgor eterno num momento
Principio e sempre principio do fim

Do corpo fica só o monumento
Da alma o gosto breve do cetim
Que se desfaz em sonho com o vento

Poema de FERNANDO TAVARES RODRIGUES
In XXI Sonetos de Amor, ficheiro que me foi enviado por NONAS

24 de outubro de 2008

MADRUGADA







Cliquem no quadradinho preto, para verem em todo o écran, vale a pena, garanto



Ele ia surfar, eu fui com ele para a praia, aproveitar a manhã que começava com nevoeiro.
Enquanto vestia o fato, ia olhando o mar, avaliando se as ondas seriam suficientemente boas e perfeitas para poder gozar o princípio do dia.
Eu sentada na areia húmida olhando o horizonte, que com o nevoeiro estava bem próximo, gostando de o ver a aproveitar bem as ondas e percebendo a disciplina interior, a concentração, a sintonia com o mar e com as ondas, a percepção da escolha, sabendo esperar por uma melhor do que outra e eu olhando relembrava o tempo em que também tinha praticado, sabendo o bem que lhe estava a fazer, o gozo que dava quando a escolha saía acertada
e de repente estava lá outra vez, escolhendo também a onda mais certa para fazer o melhor tubo, em completa sintonia, enquanto via o sol filtrado pelas gotas de água, sem tempo para me comover, mas que ficava impresso na mente, bem melhor que uma fotografia no papel
o gozo de, em pleno inverno de me levantar às cinco da manhã noite cerrada, para poder chegar à praia primeiro do que qualquer outro, tiritando de frio enquanto vestia o fato e assim ter o privilégio de poder ser a primeira a escolher a onda que me apetecesse sem olhar a quem estaria primeiro, por, eu que tenho dificuldade em aceitar hierarquias, saber que são fundamentais, obrigatórias e ai daquele que não as cumpra, as hierarquias dentro do mar.
O sol rompendo devagarinho o nevoeiro, as ondas aumentando, já nem sequer o via tão mergulhada estava nos raios solares que de vez enquanto faziam a água brilhar para logo de seguida se esconderem e reaparecerem cada vez com mais certeza, afastando aquele nevoeiro sempre mágico
céu, mar, nevoeiro, o sol rompendo já com inusitada força e eu
estava sozinha! Nem reparei que tantos tinham chegado, que o mar já estava cheio de pranchas….
ele tocou-me no ombro e quando levantei a cara ficou a olhar para mim
- são saudades mãe? Perguntou quando viu as lágrimas que me corriam pela face
Abanei a cabeça dizendo que não, sem conseguir ainda falar, arrancada tão repentinamente a essa sintonia que nos faz comungar com o Universo
- ah! sei, tocaste no mundo
Eram nove da manhã e tinham passado três horas desde que tínhamos chegado
Às vezes o tempo não existe.

22 de outubro de 2008

MEMÓRIAS




Autor Desconhecido




Quando se cruzaram, mergulharam os olhos um num outro mirando-se bem, deram-se os bons dias, mas não tiveram coragem para romper com as barreiras que tinham há tanto tempo erguido, continuando cada um o seu caminho, bengala na mão, os olhos no chão
cada um deles pensando que já eram tão velhos para poderem voltar atrás
Os passos deles abrandaram pouco a pouco conforme se iam aproximando da respectiva esquina, parando os dois, costas voltadas, cada um pensando que não valia a pena olhar para trás por outro já ali não estar, sem capacidade de se arriscarem a uma nova decepção ou a uma nova troca de olhares, sempre carregados de um misto de amor e de amargura, que lhes poderia ter resgatado a vida.
Qualquer deles tinha sido o mundo inteiro, tinha sido o alfa e o ómega da vida do outro, tinham rompido barreiras e convenções para se poderem estreitar nos braços, tinham-se escondido de todos, cada um deles prometido a um outro par que não queriam aceitar, sem nunca terem tido a coragem de afrontarem os seus e as pessoas de toda a vila, por naqueles tempos não ser permitido fazerem-se “maus” casamentos e quando tal acontecia, os infractores serem ostracizados.
Infelizmente tudo foi descoberto, por os seus olhares quando se cruzavam, em qualquer lugar, dizerem tudo o que sentiam.
As velhas começaram de cochichar, passando rapidamente palavra pela vila inteira, encontrando logo quem os quisesse espiar para descobrirem o seu segredo
Ele, por ser o que faria o casamento desnivelado, fora fraco e não conseguira defender o seu amor, apesar das juras eternas.
Ela, desonrada, apesar de também ter feito as juras, quando o vira aceitar a mulher que lhe tinha sido destinada, aceitara com mansidão fazer o inesperado casamento que o pai lhe impusera, por o par que lhe estava destinado se ter recusado a casar com ela
Ela nunca lhe perdoara a fraqueza, ele jamais lhe tinha perdoado ter casado com tanta pressa, pensando para com ele, que com o tempo teria conseguido fazer compreender aos pais ser ela o seu único amor, a única pessoa com quem poderia ser feliz.
Duas vidas desfeitas, que tentaram fazer felizes outras duas, sem o conseguirem. O amor não esquecido, a amargura de se terem sentido traídos, sempre presente, ausentes para com quem viviam.
Há já vários anos que estavam viúvos, mantendo-se o amor que os unia, mas isso só o sabiam as suas sombras que desesperadas e inconformadas saíam deles sempre que se cruzavam, agigantando-se para mais uma vez repetirem os gestos, ela tão jovem, corpo de bailarina, atirando-se para os braços dele que corria para a poder amparar nos seus braços ainda cheios de vigor, recomeçando a eterna dança do amor.
Casmurros, continuaram o seu caminho sem para trás volverem os olhos
casmurros, cruzar-se-iam amanhã uma outra vez, como vinha acontecendo há já tantos anos, só as suas sombras se reencontrando no amor que sempre se tinha mantido e que a amargura não deixava sentir.

21 de outubro de 2008

PRÉMIOS







O Prémio Dardos foi-me atribuído pela CARLA e pelo LUÍS MAIA, a quem muito agradeço.



“Com o Prémio Dardos se reconhecem os valores que cada blogueiro emprega ao transmitir valores culturais, éticos, literários, pessoais, etc., que, em suma, demonstram sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre suas letras, entre suas palavras. Os selos foram criados com a intenção de promover a confraternização entre os blogueiros, uma forma de demonstrar carinho e reconhecimento por um trabalho que agregue valor à Web.

Quem recebe o “Prémio Dardos” e o aceita deve seguir algumas regras:
1 - Exibir a distinta imagem;
2. - Linkar o blog pelo qual recebeu o prémio;
3. - Escolher quinze (15) outros blogs a que entregar o Prémio Dardos.”

Dos meus escolhidos, alguns já foram nomeados.

A VOZ PORTALEGRENSE

FUNES EL MEMORIOSO

DIÁRIO DE UM HOMEM BANAL

O PRIVILÉGIO DOS CAMINHOS

FRONT OFFICE

LUGAREJO DE PALAVRAS

INSÉTE

OFÍCIO DIÁRIO

SUBLIME PORTA

MIGALHAS

NÃO HÁ RIOS IGUAIS

A MINHA PINTURA, DESENHO E GRAVURA

VIVO E DE BOA SAÚDE

UMA NOVA CUBATA

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20 de outubro de 2008

O SONHO DE MARIA ANTÓNIA





Ah este Outubro! Todos os Outonos!
Maria Antónia sente aquele ar parado, leve e quente, aquela luz filtrada pelas folhas douradas que vão encarniçando deixando no chão um jogo de luz e sombras tão acolhedores.
Sai pelo campo fora e anda perdida olhando a luz e as sombras, tentando adivinhar figuras no chão desenhado, acabando por se sentar no chão quente que lhe transmite promessas de vidas por vir, nuas por escrever.
Deita-se sentido o calor da terra e por cima a sensação do fresco e do calor, conforme o sol lhe toca ora ali, ora acolá.
Nesse doce enlevo deixa-se adormecer e sonha que está num campo desolado e árido à beira de um precipício. Junto dela começam a nascer da terra grandes blocos de pedra que devagar, para não a despertar ou não lhe fazer medo, se vão perfilando, enquanto ao seu redor nasce um campo de flores.
Os blocos de pedra vão tomando forma, primeiro aparecendo uma mão que a defende de rebolar para dentro do precipício: depois o respetivo braço, o ombro de onde sai uma cabeça que se apoia à outra mão e que a olha pensativo vigiando-lhe o sono.
A cabeça abre-se, só um pouco e de dentro dela escorre para Maria Antónia um rio de serenidade para que não se assuste, enquanto lhe mostra o horror do mundo em que vive.
Um mundo feito de pedra endurecida, estéril, árido, onde todos se guerreiam, mesmo aqueles que se dizem amar, ou que já foram amantes. Todos se traem, cada um empunhando a sua verdade para com ela guerrear meio mundo, enquanto o outro meio morre de fome ou de doença. Não há ninguém que estenda uma mão, ou que ajude a levantar o seu vizinho. Todos empurram ou ajudam a enterrar.
Ela defende a sua raça, a humana, mostrando da mesma forma serena que não é assim tão mau.
Há quem individualmente leve punhados de terra conseguindo fazer a sua montanha, com passagens para outros lados sempre estendendo a mão, mesmo o braço, para ajudar a levantar quem precisa. Tenta convencê-lo que o mundo não se destruirá, mesmo que pareça estar a afundar-se. São ciclos de mudança, em hélice, que tão depressa parece que tudo se desaparecerá, como de repente começa a dar frutos, havendo um esforço conjunto para todos se salvarem
A conversa prolonga-se, os argumentos dele, pesados, como bátegas de chuva que nada lavam e que tudo arrastam, que tudo destroem, como são sempre os argumentos de quem fala do que já se passou ou continua a passar
Os argumentos dela, pausados, luminosos, como o sol quando tenta descerrar o nevoeiro, como são sempre os argumentos de quem nada mais tem a não ser a esperança.
Ele olhando-a com ternura com um lado da face, deixando-se embalar pela litania dela que não pára, o outro lado da face olhando o mundo com ar severo de quem com gosto tudo arrasaria, sem saber a qual dos dois cederá.
Desiste de optar, pensando que nada há como lhes dar mais tempo, para ver quem melhor o convencerá:
Se o mundo que ele vê
Se o mundo que ela defende
Acorda estremunhada, levando-se, sentindo uma alegria enorme dentro de si, pensando que o convenceu, sabendo que pouco poderá fazer a não ser a sua parte e acreditando que muita destruição ainda haverá por esse mundo fora até começar a dar frutos o trabalho de quantos, desgarradamente, lutam para o melhorar.
A angústia só aparece mais tarde, quando se apercebe que não sabe quanto tempo foi dado….


18 de outubro de 2008

BOM SÁBADO!




NADA COMO COMEÇAR BEM O FIM DE SEMANA, PARA ISSO ACONTECER A AUTO ESTIMA DEVERÁ ESTAR EM ALTA.
O MELHOR MESMO É REPARAREM COMO SÃO AS ESTRELAS ANTES DE E DEPOIS DE SE MAQUIAREM!







OU ESTE





17 de outubro de 2008

ARTE E BELEZA






PORQUE É UM BOM DIA PARA OLHAR ARTE E BELEZA
de JIA LU DOIS VIDEOS,QUE SÃO RESPOSTA AO TERCEIRO QUE SE CHAMA "100 GREAT NUDES"
Divirtam-se, como eu me diverti à procura














16 de outubro de 2008

BONS BLOGS






Descobri, por mero acaso, este blog A MINHA PINTURA, DESENHO E GRAVURA, que gostei muito.
CATARINA GARCIA dá a conhecer o seu trabalho.
O meu espanto, foi a Catarina só ter 22 anos. Tem um traço excelente.
Para quem gosta de pintura desenho e gravura, este é um blog para se acompanhar, além evidentemente da carreira de Catarina.
Também faz animação e vou aqui deixar um dos seus excertos de animação que já fez.
vejam-lhe o perfil porque tem 3 blogs.







VOLTOU!!!!

Com a sua maravilhosa escrita!
Um blog a não perder, como já o era o anterior, e um template que só apetece entrar e ficar.
LUGAREJO DE PALAVRAS da CRIS
Não é preciso dizer mais nada, pois não?

15 de outubro de 2008

MÁRIO do A VOZ PORTAGRENSE





OBRIGATÓRIO ESTE POST DO MÁRIO

mas dizem os SENHORES DA POLÍTICA E DA ECONOMIA, que o mercado continua de saúde!!!!

Como é? CHORAMOS OU RIMOS?


13 de outubro de 2008

UMA OUTRA MARIA



A MATESO escreveu no seu belíssimo blog aArtmus, DEGRAUS um espectacular conto sobre a vida de uma mulher, Maria.
O conto, como costume, está excepcionalmente bem escrito, com uma poesia e detalhes habituais na escrita de Mateso.
Apenas achei que era um dos aspectos de uma vida, que haveria mais aspectos possíveis e perguntei-lhe se poderia dar a minha visão de Maria.
Com a autorização de Mateso, aqui está.
Não deixem de ir ler o conto da Mateso, até porque uso a estrutura que achou por bem dar ao texto, que achei muito bem conseguida.


Frederic Larson




Acordou a meio da noite, como lhe acontecia há já algum tempo, sentindo-se a fervilhar de impaciência.
Sentia que havia já um distanciamento entre os dois, palavras esquecidas por não serem ditas, gestos não repetidos por terem sido esquecidos, por isso a insatisfação que sentia, a impaciência a irritabilidade, seria pela profissão que ambos afincadamente perseguiam? seria a rotina?
Levantou-se e foi até à cozinha, sempre às escuras como era seu costume, onde se sentou a comer uma maçã, roída com voracidade, maneira que tinha de deixar escoar todos aqueles sentimentos que a incomodavam, a impacientavam. Olhando a rua que o candeeiro iluminava, perguntava-se onde estava a alegria quando se viam, onde estava a bela recepção quando um deles chegava mais tarde, onde estava....ui! tanta coisa, pequenas coisas, mas que faziam da vida uma festa. Teria de ser a rotina a instalar-se, apropriando-se da vida dos dois e dos seus sonhos. Não, as coisas não poderiam ficar assim, os seus trinta e dois anos e a sua maneira de ser de oito ou oitenta, não lho permitiam, rebelavam-se contra esta situação
Abanou-o, empurrou-o, discutiram, umas vezes azedamente, outras com um pouco mais de calma, mas fez-lhe ver que assim não ficaria, não continuaria, não queria assistir ao acabar do amor entre eles, com um simples encolher de ombros. Fez-lhe ver, que a rotina a matava, que tinham de inventar maneiras de manter acesa a paixão e essa vontade de comunicarem entre eles, mesmos se os interesses não eram os mesmos. Aprenderiam os dois um com o outro.


Maria estava mais uma vez na cozinha roendo uma maçã, o que nunca era muito bom sinal. Ia nos cinquenta e com algum medo das transformações que o seu corpo já sentia.
Deu por ela a pensar como tinham passado apressados os anos....
Não, ela não tinha abrandado nem amolecido. Guerreira, sempre que o sentia mais afastado lá o abanava, tornava a empurrar, discutia mais um pouco e encarreiravam, mais uma vez.
Agora era ela que sentia necessidade de apoio, que não se sentia tão bem na sua pele.
Sim, os interesses de ambos tinham-se afastado mais ainda, mas reconheciam-se nesse direito, nessa independência e tinham sentido que até tinha sido bom para os dois. Entrecruzavam as informações, partilhavam aprendizagens e quando algum parecia mais predisposto a abrandar, o outro espicaçava-o não o deixando entregar-se à rotina. O amor tinha florescido, tinham inventado códigos só deles, cumplicidades e risos que mais ninguém percebia e apesar das asperezas da vida, que não poupa ninguém, tinham singrado lado a lado, tendo consciência que não seriam tão felizes se não estivessem juntos.


Acordara mais uma vez durante a noite.
Acordava, agora, tantas vezes durante a noite, tantas noites desde que ele tinha tido há três meses um ataque cardíaco e ela desde esse dia em que sentira, pela primeira vez, que o podia perder nunca mais dormira bem, quase com medo que ele partisse sem ela se dar conta. No fundo, no fundo tinha medo que ele partisse primeiro....
Ali na cozinha, roendo uma maçã, já não de forma voraz, já perto dos setenta anos, relembrava um tempo em que estivera por um fio o seu casamento, não fora a sua atitude de luta perante a vida e talvez se tivessem afastado de vez. Relembrava o amor que lhe tinha e como ele lhe correspondia, a maneira terna como lhe passava o braço pela cintura sempre que a queria beijar, a forma como lhe retirara os medos da menopausa fazendo-lhe ver que era o princípio da libertação, o princípio de uma nova fase da vida, o princípio da maturidade. Se não fosse ele jamais teria encarado esse período como uma mais-valia. Desse facto adviera uma liberdade para se entregarem sem nenhuns constrangimentos sem estarem preocupados com tempos. O mundo continuava a ser deles.
Ultimamente ele preocupava-se mais com ela, por tantas vezes acordar durante a noite, sabendo o que ela sentia. Não eram já necessárias as palavras entre eles.
Parecendo que a pressentia, sempre acordava pouco depois e vinha amorosamente buscá-la à cozinha, onde sabia que a encontraria roendo uma maçã.
- quantas já roeste esta noite, Meu Amor?

12 de outubro de 2008

OUTONO












Talvez o que te dei fosse demais
Talvez tenha faltado quase tudo
Dei-me eu o que posso dar eu mais
Depois de amar-te surdo cego e mudo

Todo aquele mar azul que nos sabia
Ao pôr do sol ainda enamorados
Já não étão azul como parecia
Quando nos recebia apaixonados

Talvez o meu engano fosse amar-te
E o teu acreditar que era possivel
Fazer do amor apenas uma arte

Um Outono em vez de Primavera
Um amor louco sim mas impossivel
Como se tudo fosse ainda como era


Poema de FERNANDO TAVARES RODRIGUES
In XXI Sonetos de Amor, ficheiro que me foi enviado por NONAS

10 de outubro de 2008

ILUSÃO





Helene Knoop




Era pequenina ainda, tão pequenina, a Amélia quando começou a pensar no futuro, quando começou a desejar ser um dia mais tarde feliz.
Não teria mais de oito anos, quando no meio do caos em que vivia teve um sonho, Amélia nunca conseguiu dizer se estava acordada ou a dormir, tão bem delineado lhe apareceu que julgou ser verdadeiro.
Sonhou que um dia haveria de ser tão amada, mas tão amada, que ele se transformaria num anjo e a levaria nas suas costas a passear pelo Universo mostrando-lhe a Lua, Neptuno ou Marte, e que a levaria aos saltos pela Via Láctea.
Depois desse sonho, Amélia tornou-se indiferente a tudo o que lhe faziam, podia cair o Carmo e a Trindade, que ela nem queria saber, estando sempre escondida dentro do sonho.
Foi crescendo e o caos á sua volta cada vez era maior, mas continuava escondida, ausente de tudo e de todos, esperando a maioridade, que pensava ela lhe traria o sonho ou o anjo.
Um dia caiu-lhe, quem ela julgava ser um anjo, no meio da sopa, quando o João lhe apresentou num restaurante um amigo e ela riu pela primeira vez desde há muitos anos e foi brilhante, sedutora, rindo-se ele com ela.
Amélia resolveu ir viver com o anjo, acabando por descobrir que de anjo nada tinha, que o amor era pouco e a felicidade não existia...
Vagueou pela vida procurando o sonho, não acreditando que não existisse, por não ser possível ter-lhe aparecido tão nova e tão definido, para chegar à conclusão de ser uma simples e dramática ilusão.
Estaria nos quarenta e muitos, já esquecida do anjo, fabricando a sua felicidade diariamente, cínica quanto a homens, anjos ou sonhos, tendo aprendido à sua custa que mais vale admirar a Lua e as Estrelas cá de longe, do que acreditar que algum dia poderia lá chegar perto.
Amélia foi a um casamento de uma amiga, já o terceiro era certo, mas mesmo assim romântico nas juras eternas, e ficou numa mesa onde não conhecia ninguém, a maior parte das amigas divididas entre os diversos casamentos que tinham acontecido naquele dia
A conversa estendeu-se, ela tão distante conversando sobre tudo e nada, apenas reparando num dos homens, que era mais alegre do que habitualmente são as pessoas nestas idades, como se a vida lhe tivesse sido fácil, leve e que era envolvente. Achou graça, nada mais.
Uns dois ou três meses depois, Amélia voltou a encontrar o desconhecido alegre e leve, num workshop. Uma semana inteira de intenso trabalho, mas que à hora de almoço se transformava em gargalhadas e havia Sol, mesmo quando a chuva era intensa.
Passaram a encontrar-se quando lhes era possível e o desejo foi-se instalando, resolvendo os dois que o melhor era colmatá-lo, ficando sempre a permanente sensação de fome
Por isso, para estarem mais perto, foram viver juntos, pensando ela que tinha encontrado o seu anjo, que há tanto tempo tinha esquecido, mas que a levou nas suas costas, voando, a passear pela Via Láctea, foram espreitar Neptuno e Marte, tendo ela pela primeira vez passeado pelo o Universo, deixando para o fim a Lua.
Lá sentados, ele disse-lhe que se tinha apaixonado por outra.
O seu anjo em mil pedaços ficou desfeito, mas sempre se lembrava que pelo menos tinha descoberto o Universo e que por lá tinha passeado.
Mas Amélia aprendeu ao mesmo tempo que se desfazia o anjo, que podia lá voltar sempre que quisesse e que se ainda não o tinha feito anteriormente, era por julgar que só um anjo lhe poderia ensinar o caminho, quando afinal tinha por lá andado a passear sozinha, simplesmente acompanhada de um mortal
Hoje quando ouve falar em anjos, sorri trocista e diz que anjos não existem, e que se os houver, por não terem sexo, para nada servem.

8 de outubro de 2008

AUSÊNCIA DE SONHO





Frederic Larson




Não me lembro de ter sonhos de infância, lembro-me bem dos pesadelos, de leões, baratas e outros monstros que me perseguiam, sempre muito maiores do que eu, mesmo as baratas, gigantes e eu tão pequenino do tamanho de um grão de ervilha que acordava encharcado em suor e gritando, sei lá por quem, que nunca aparecia, quando ia ser agarrado.
Não, nunca tive sonhos de criança, ficaram enterrados não sei onde, porque se soubesse onde estavam escondidos teria lá ido buscá-los, só tive pesadelos na infância sobre o que se ia passar no dia seguinte, mesmo quando não podia prever o que iria acontecer, sendo que esse era o pior pesadelo.
Sonhos? Não, nunca tive esse privilégio, o único sonho que tive já no meio da adolescência, foi poder sair daquela casa fosse como fosse, fosse para qualquer outro lado, tanto fazia, que pior era difícil.
Só sonhei quando já era mais velho, por qualquer dos meus amigos viver num universo com que sonhava poder ter tido, ou que mais tarde pudesse ter, foi talvez esse o único sonho que me vinha abrandar a vida.
Sonhar foi sempre um impossível sonho
mas mesmo ao meu lado tinha uma irmã que sonhava o tempo todo, sonhava também em sair de casa, mas agarrou-se de tal maneira a esse sonho que só vivia o futuro, quase sem ligar ao presente a não ser quando lhe chegava da pior maneira, sofria mais do que qualquer outro, porque caía do céu aos trambolhões
Lá em casa ninguém sonhava, todos viviam em pesadelo.
Quando saí de casa, finalmente, reeditei o pesadelo por já não saber viver sem ele, porque para se sonhar é necessário ter-mos praticado
Agora que estou para aqui meio-desfeito, percebo como é fundamental poder ter-se sonhado, para não se cair neste erro de viver rodeado de pesadelos já por mim criados, por hábito, por ser mais fácil, por ser tão difícil tudo mudar, por ter medo do desconhecido, que sempre é melhor ter pesadelos e da vida nada esperar, do que sonhar e ter desilusões que são a pior forma de pesadelos.
Não sonhei, não tive ideais, não me bati por nada, fiquei agarrado aos pesadelos, fazendo de conta que tinha uma vida impecável, enganando todos que de mim se aproximavam sem perceberam que era nada, fogo-fátuo, conquistando quem queria, deixando rasto de maravilhoso, enquanto ignóbil ia destruindo ilusões, amores, ou quem quer que de mim se aproximasse, rindo sempre de tão fácil ser a todos enganar.
Passei pela vida sem reparar
Sem viver, sem amar
fazendo com que me amassem, mas sem jamais lhes ter retribuído
sem sonhar, nem sei o que a palavra quer dizer
meio morto, vegetei

6 de outubro de 2008

RADIOGRAFIA DE UM DIVÓRCIO II




Imagem tirada DAQUI



Há ventos tão fortes que parece que tudo arrasam, mas às vezes só cobrem o chão de um manto de espessa de geada, que sufoca qualquer emoção que ainda tenham guardado e quando se vão deixam-no vazio, chão parecendo infértil mas não danado, terra que não será queimada, tão sómente adormecida
Eles, travessos, alegres
ciumentos, violentos e ternos
sabendo que talvez agitando-se poderia partir o gelo, mas ficando na sua, sufocado, sofrendo, sem já ter forças para nada modificar, deixa-se enterrar por mais gelo que continua a cair. Fica à espera que o sol que tem ao lado derreta essa camada de gelo e o volte a reencontrar, calado espera que se derreta esse gélido manto quase de morte. Fica impaciente, ausente, chão a ficar estéril por o sol afinal não ser suficientemente quente para derreter toda a geada caída, que a todos afeta
Eles, travessos, ternos
desconfiados e embirrentos
Um dia, quando menos espera aparece um outro sol, forte vigoroso, que derrete eficientemente a capa espessa de geada, ficando agarrado, extasiado por esse sol não o deixando mais de admirar, apesar de sofrer, avisa que renasceu.
A raiva do outro atinge-o, pegasse-lhe peçonhentamente, mas o chão começa a germinar, apesar de tudo ruir em sua volta. Chão que se tornou florido, apesar de
Eles chorarem pelos cantos
E a vida continua por um lado bela, por outro de inferno feita. As contas pedidas sem medida, as raivas caindo-lhe em cima continuadamente, sem sossego, só o encontrando junto de um sol que não sabe se para sempre quer, balançado como haste frágil, ficando os pés num lado o coração noutro
Eles só o vendo de 15 em 15 dias
violentos, chorando pelos cantos
Ele sem saber o que fazer da sua vida, sem saber o que querer, raivoso impaciente e feliz, à espera que a vida se resolva….
talvez daqui a uns dias, ou daqui a uns meses, talvez daqui a uns anos.
Eles em silêncio
só o vendo de 15 em 15 dias
sem saberem o que lhe dizer
não reconhecendo a casa onde vão, como sua
sabendo que deste lado, não chega a primavera

4 de outubro de 2008

VIDA

MERCEDES SOSA - GRACIAS A LA VIDA (VIOLETA PARRA)





La Source - Claude Théberge



Talvez não tenha dito que te amo
Quando depois de te amar te dei um beijo
Na sombra do lencol deixei o ramo
Da paz que junto a ti hoje festejo

Palavras sim palavras disse tantas
Mas não talvez aquelas que esperavas
Porque é no teu silêncio que me encantas
Por muito mais que aquilo que pensavas

Tu és quando desperto a alvorada
A luz que me alimenta todo o dia
Do meu amor a última morada

E é em ti que o dia principia
Quando depois do amor ainda cansada
És um nenúfar branco de alegria



Poema de FERNANDO TAVARES RODRIGUES

In XXI Sonetos de Amor ficheiro que me foi enviado por NONAS

3 de outubro de 2008

MULHER QUE NO RIO LAVAS

Fotografia de NUNO DE SOUSA
Mulher que já depois de tantos anos da revolução e de revolucionárias, a pedirem, a exigir, condições iguais, ainda aí está lavar a roupa no rio, que consigo leva a tábua de esfregar, os alguidares e o detergente, sem água canalizada ou esgotos.
Nem tempo tem para no rio se mirar, galochas altas calçadas, esfregando a roupa do seu homem….
Olho as sombras e os reflexos, e toda esta beleza, quando tempo tenho
Quando era jovem vinha para aqui namorar e ele dizia-me que era a cachopa mais linda, de entre todas a escolhida, e eu ria-me e ficava todo orgulhosa….….no rio, enquanto por ele esperava, olhava meu reflexo com os outros misturados e gostava do que via, cabelo comprido muitas vezes feito em trança, delgada como um junco……que rápido passa a juventude, sem termos tempo de nela mergulhar; quando vamos por ela, já não existe, fica só a marca.
Felizmente não sabemos o que o futuro nos traz, não é que tenha queixas a fazer, porque saúde tenho e trabalho não falta, felizmente, mas é vida de labuta que não me deixa em nada pensar, que faz com que chegue à cama derreada, sem vontade de nada e o meu homem ali a querer mais do que lhe posso dar.
Claro que tem razão, a Senhora, a vida não deveria ser só labuta, mas que havemos de fazer, os homens ainda não nos ajudam, nem me posso queixar do meu, que não é homem que venha da taberna bebido, que bebe também, mas não vem para casa a cair como tantos que por aí andam, nem vem a embirrar com ninguém, que nunca me bateu, tem defeitos como todos nós, mas não são nada por aí além.
Com os filhos? Não senhora, não ajuda com os filhos, mas isso é natural, os filhos é com as mães…está bem que também trabalho, mas os filhos sempre com as mães foram, só lá para a cidade é que as coisas mudaram e isso que está a dizer, deve ser só por lá ouvido.
Mas às vezes ao sábado quando o dia está lindo como hoje, venho para aqui sentar-me e às vezes, se não está ninguém à vista, até me banho, muitas vezes fiz isso quando era garota e mais tarde também, as saudades que tenho do tempo livre que então tinha…..Não era muito que lá em casa éramos tantos que tinha de ajudar minha mãe, mas sempre tinha mais do que agora.
Mas nesses sábados que para aqui venho, até uma alma nova arranjo, e deixo-me ficar a olhar o rio que vai até Lisboa e penso se um dia me deixasse ficar a vogar nele se me levaria também, tão docemente como o faz às folhas que na água caiem.
Não sei nadar não, mas também não preciso, porque o rio só aqui é quentinho, aqui na margem com água pouca, com este sol depressa aquece. Mas hoje não tenho tempo.Aquilo que estava a dizer era só a pensar…..é o que penso quando tenho tempo para um pouco descansar. Não me faz falta e daqui não quero sair, o que queremos é ter melhores condições de vida.
Então até qualquer dia. Gostei de estar este bocadinho na conversa com a Senhora…….Ui! mas já me atrasei tanto…..Boa Viagem!



NOTA:Este post foi editado no dia 4 de Abril de 2008 no blog CASA COMUM, que merece as vossas visitas.

1 de outubro de 2008

RADIOGRAFIA DE UM DIVÓRCIO



STIFFELIO - CENA DO DIVÓRCIO






Imagem tirada DAQUI



Há ventos tão fortes que parecem que tudo arrasam, que levam toda e qualquer emoção que tenhamos guardado no mais fundo de nós, que nos arrastam para lá do admissível, revolvem-nos, viram-nos do avesso, e quando se vão deixam a devastação, chão infértil e danado, terra queimada e salgada de lágrimas amargas, onde nunca mais uma semente germinará.
A raiva e o ódio são seus parceiros.
Eles chorando pelos cantos
A raiva escondida, sentimento destruidor, germina normalmente com força inusitada e quando se mostra, já é a cara do ódio que muitas vezes aparece, arrasa o pouco que o vento não levou, deixando nada, nada mesmo, onde se possa deitar uma mão em caso de aflição.
O chão danado, só mostra desilusão e demos que rondam riem e troçam, largando baba peçonhenta onde os pés se arrastam sem conseguirem sair do mesmo sítio. O esforço para se dar um passo, exorbitante
e fica-se ali dias meses ou anos, pensando que se está a avançar…
Eles deixando de chorar pelos cantos
um dia, sem se saber bem como vê-se uns reflexos de luz, ainda não sol, mas que com a continuação poderão vir-se a ser claridade
mas não se consegue ainda largar os demos, que sempre fazem uma algazarra própria, cansativa, mas que serve de companhia e assim se vai ficando, infértil raivoso, danado
Eles passando a ser o apoio dela
mas chega o dia, em que já não se pode esconder o sol, o chão ainda não germina, porque não se querem ver rostos, nem pessoas, apesar de sempre se ter ido trabalhar, sem se saber como, nem como se fez, ausente de si e dos outros.
O sol resolve trazer um amigo e sabe-se lá porquê, esse é visto, apesar de o interesse ser nenhum, o chão abriga a semente da esperança e essa germina sempre mesmo quando os demos não querem partir
Eles começando a rir
acontece por fim. Ela está refeita e assume a vida por inteiro. O chão, que tinha pensado que jamais germinaria, é campo de flores que principiam a rebentar
Eles chorando pelo colo que não tiveram,
sabendo que chegou a primavera